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Pesquisa analisa estratégias de transferência do conhecimento produzido na ENSP

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Publicado em:16/05/2006

Como os pesquisadores da ENSP transferem os resultados de pesquisa em políticas, sistemas e serviços de saúde aos tomadores de decisões? Essa foi a pergunta que orientou a pesquisa do curso de mestrado em Saúde Pública da aluna Cristina Acosta, orientada pela pesquisadora Lígia Giovanella (Daps/ENSP) e defendida em maio. A apresentação de Cristina Acosta está disponível na Biblioteca Multimídia da ENSP.

Segundo o levantamento bibliográfico feito por Cristina, cada vez mais, a transferência de conhecimentos é considerada uma ferramenta capaz de diminuir a distância que existe entre ‘o que se conhece sobre como responder a um problema particular’ e ‘o que realmente se faz na prática’. A questão é que, para que isso ocorra, é necessário que se estabeleça uma nova relação entre os pesquisadores e os tomadores de decisões.

“A relação entre a criação de conhecimentos e a tomada de decisões em saúde tem sido assunto de muitos estudos do campo da Investigação em Sistemas e Serviços de Saúde, e a questão não é muito simples. Na brincadeira, o pessoal costuma dizer que depois de formular a pergunta de pesquisa, coletar a informação, analisar os dados e escrever o relatório começa a parte mais difícil da pesquisa aplicada”, conta, destacando que a frase faz alusão aos inúmeros obstáculos que dificultam o processo de transferência do conhecimento, tornando-o, por vezes, mais complexo do que sua própria produção.

O trabalho utiliza a definição ‘transferência de conhecimento’ como o processo interativo e comprometido de vinculação e intercâmbio de conhecimentos entre pesquisadores e tomadores de decisões, que ocorre quando ambos assumem responsabilidades por articular os conhecimentos e as tecnologias produzidas pela comunidade científica aos processos decisórios necessários para produzir impactos positivos nos sistemas e serviços de saúde.

Para Lígia Giovanella, que orientou Cristina em sua dissertação, ainda que a ENSP possa ser considerada uma Escola de Governo, com inúmeras atividades de pesquisa vinculadas às políticas e programas de saúde, é necessário desenvolver estratégias de difusão de informações que sintetizem os resultados substantivos de diversas pesquisas sobre um mesmo tema ou problema, permitindo que eles sejam direcionados à ação. “A importância desse trabalho é que, além de mostrar que, na ENSP, ainda podemos ampliar nossas estratégias de difusão de resultados de pesquisa, ele oferece diversas alternativas para isso”.

Pesquisa analisa quatro dimensões da transferência de conhecimentos

A pesquisa ‘Transferência de resultados de investigação em políticas, sistemas e serviços de saúde numa organização de saúde pública’ utilizou, como referencial metodológico, o modelo desenvolvido por John Lavis (2003), que analisa o processo de transferência de conhecimentos segundo quatro dimensões: mensagem, audiência, mensageiro e processo de transferência.

No âmbito da ENSP, o objetivo de Cristina era identificar: o tipo de mensagem que os pesquisadores da Escola utilizam para transferir os resultados das pesquisas para os tomadores de decisões; para quais usuários da informação os resultados dos estudos são transferidos; quem são os responsáveis pela transferência dos resultados e que iniciativas são utilizadas para promover a transferência; se os usuários da informação são, de alguma forma, envolvidos no processo de pesquisa; e se a infra-estrutura de comunicação da ENSP é utilizada como apoio à transferência de resultados das pesquisas. “Foi enviado um questionário a 71 pesquisadores da ENSP que coordenaram projetos de pesquisa em políticas, sistemas e serviços de saúde, em execução ou concluídos, no período 2000-2005. Cinqüenta e sete deles responderam”, conta.

Entre os projetos analisados – 77% deles concluídos e 23% em execução – as principais temáticas eram: avaliação de políticas, serviços e programas de saúde e gestão e organização do sistema de saúde. Cinqüenta e três (93%) eram financiados por uma ou mais instituições. Em 42% dos projetos financiados, as instituições financiadoras estabeleceram algum tipo de atividade de transferência de resultados para tomadores de decisões.

Resultados mostram que é preciso incorporar atividades de transferência de resultados na formulação das pesquisas da ENSP

Sobre o tipo de mensagem utilizada pelos pesquisadores para a transferência dos resultados de seus projetos, Cristina observou que apenas em 20 projetos foi elaborado um resumo executivo do relatório final. Em 35, além do relatório, foram feitas recomendações sobre a questão estudada e em 17 foram desenvolvidas intervenções a partir dos resultados de pesquisa. “Geralmente, o resumo executivo foi resultante da preocupação da instituição financiadora do projeto com a transferência de conhecimentos. A elaboração de recomendações, por sua vez, parece ser um esforço dos pesquisadores para ajustar os resultados obtidos ao contexto no qual podem ser úteis”, enfatiza, ressaltando: “Concluir o relatório técnico de uma pesquisa aplicada é uma das partes do processo de transferência que levará os resultados de pesquisa até as mãos de quem pode utilizá-los, ajudando-o a tomar decisões informadas pela evidência dada”.

Os gerentes de serviços de saúde foram considerados como os potenciais usuários dos resultados obtidos em 56% dos projetos, seguidos dos gestores federais (54%), municipais (51%) e estaduais (49%), dos profissionais de saúde da linha de frente (47%), dos usuários dos serviços de saúde (21%) e, por fim, do público em geral (14%). “É importante destacar que em 52 projetos, 92% do total, foram considerados dois ou mais públicos-alvo para a transferência dos resultados de pesquisa, e que a discussão com gestores e gerentes de saúde sobre possíveis intervenções a partir dos resultados de pesquisa foi mais freqüente entre os pesquisadores com experiência na área gerencial”, diz Cristina. Para ela, os entrevistados mostraram certa preocupação em adaptar a informação a ser transferida às características do público-alvo identificado, mas isso não se refletiu nos tipos de mensagem utilizados para a transferência.

Quanto aos responsáveis pela transferência dos resultados obtidos, foram poucos os projetos que dedicaram recursos humanos e financeiros específicos para essa atividade, considerando-a como parte integrante do processo de pesquisa. Segundo a autora do trabalho, apenas 21 projetos (37%) destinaram parte do orçamento para atividades de transferência de resultados e 14 deles (25%) empregaram uma equipe de pessoas com essa função. Em oito projetos (14%), foram criados incentivos para que os pesquisadores se comprometessem com atividades de transferência de resultados.

Uma curiosidade, segundo Cristina, é que os pesquisadores entrevistados fizeram pouco uso da infra-estrutura de comunicação da ENSP como apoio para as estratégias de transferência dos resultados das pesquisas realizadas. “Aproximadamente um terço dos projetos utilizou o boletim eletrônico da ENSP (30%), ou listas de correio eletrônico da instituição (25%) ou os portais da ENSP e da Fiocruz (28%). Alguns poucos projetos (12%) utilizaram a revista Radis para divulgar seus resultados, mesma proporção do número de projetos que utilizou o Canal Saúde”, observa. Nesse universo, o Informe ENSP foi o veículo mais utilizado.

No que diz respeito ao processo de transferência, a pesquisadora identificou que em 17 projetos (33%) houve participação de representantes do público-alvo em um ou mais momentos do processo de pesquisa. Em 37% das pesquisas analisadas, a participação ocorreu ainda na definição do objetivo geral do projeto. Em 28%, na formulação de uma pergunta, um objetivo ou uma hipótese. O estabelecimento do desenho e da metodologia de 26% das pesquisas contou com a colaboração de potenciais usuários dos resultados a serem obtidos. Tanto a execução do projeto quanto a análise e interpretação dos resultados foram os momentos de participação dos prováveis usuários dos resultados em 25% dos projetos analisados. Apenas em oito projetos (14%) a participação ocorreu durante todo o processo de pesquisa.

Instituição deve estimular o compromisso dos pesquisadores com a transferência dos resultados dos estudos que realizam

De acordo com Cristina, a identificação dos gestores dos três níveis de governo como seus principais públicos-alvos mostra que o campo de pesquisa em políticas, sistemas e serviços de saúde da ENSP está sincronizado com as instituições do Estado brasileiro. “A Escola também parece exercer certa influência sobre o processo decisório desses gestores por meio das discussões dos resultados de pesquisa e de possíveis intervenções. Por outro lado, se essa interação tender a aumentar a compreensão dos tomadores de decisão sobre a evidência científica e sobre as implicações políticas acerca do objeto de estudo, melhorando o debate, ela nem sempre gera melhores resultados políticos”. Ela também enfatiza que a transferência de resultados ocorreu com maior freqüência entre os pesquisadores que já desempenharam atividades gerenciais ou de consultoria e quando a instituição financiadora estabeleceu atividades específicas voltadas para esse processo.

Para ampliar a transferência de resultados, a pesquisadora sugere que os fundos de pesquisa estratégica da Fiocruz e da ENSP devam incorporar mais estratégias de transferência de conhecimentos, privilegiando a informação sintetizada e adaptada às necessidades dos públicos-alvo. Além disso, ela recomenda que, institucionalmente, a transferência de conhecimentos deva ter um marco conceitual e uma definição operacional, para poder ser incorporada aos processos de pesquisa que se dão no seu interior. “A instituição deve sensibilizar, capacitar e apoiar seus pesquisadores na transferência de conhecimentos, criando, por exemplo, critérios de desempenho em atividades de transferência de conhecimentos como reconhecimento acadêmico e curricular. A Coordenação de Comunicação Institucional (CCI/ENSP), por sua vez, pode atuar como um importante intermediário do conhecimento, assessorando os pesquisadores da Escola na adaptação da informação para os públicos-alvo, criando redes para compartilhar os conhecimentos de pesquisa e fortalecendo sua atuação no jornalismo científico”, acrescenta.


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Divulgação Científica Radis

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