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Gestão da Assistência Farmacêutica para Medicamentos Judicializados precisa ser revista, segundo artigo da ENSP

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Publicado em:15/10/2019
Gestão da Assistência Farmacêutica para Medicamentos Judicializados precisa ser revista, segundo artigo da ENSPDesde a década de 1990, as solicitações de medicamentos por via judicial vêm se intensificando. Somente seis gestores de 16 municípios do sudeste brasileiro, estudados por pesquisadores da ENSP, informaram que realizavam análise técnica das prescrições e contato regular com o judiciário. “A gestão municipal tem papel preponderante sobre a gestão da Assistência Farmacêutica e precisa ser revista”, alerta a pesquisa.
 
Segundo o artigo Falhas na gestão da Assistência Farmacêutica para Medicamentos Judicializados (MedJus), em 16 municípios da região Sudeste brasileira, das pesquisadoras Tatiana de Jesus Nascimento Ferreira, Rachel Magarinos-Torres e Claudia Garcia Serpa Osorio-de-Castro, da ENSP; e Claudia Du Bocage Santos-Pinto, da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, as solicitações de medicamentos, insumos e serviços de saúde por via judicial passaram a se intensificar em áreas específicas, como a da Síndrome da  Imunodeficiência  Humana  Adquirida (Sida) ou Human Immunodeficiency Virus/Acquired Immune Deficiency Syndrome (HIV/Aids), agudizando-se e tornando-se mais abrangentes nos anos 2000. 
 
Para as pesquisadoras, considerando que a provisão de medicamentos é de responsabilidade solidária entre os entes federativos, e de repercussão geral, a judicialização parece interferir diretamente  neste  aspecto  da  gestão  da  Assistência Farmacêutica (AF), especialmente no nível municipal,  que  proporcionalmente  detém menor poder aquisitivo e maior dependência das instâncias superiores. “Importa também a qualidade da gestão da AF presente, seja no estado ou no município, campo ‘fértil’ para o estabelecimento e crescimento da judicialização.”
 
Investigando  alguns  municípios,  Santos-Pinto postulou que uma gestão incipiente da AF retroalimentaria a ocorrência de demandas judiciais por medicamentos. Frente à escassez de recursos e à necessidade de mobilização da gestão para atender às demandas, importa saber como um município gere os MedJus.
 
O artigo explica que a região Sudeste brasileira é um local importante dentro do contexto nacional, seja pelo seu desenvolvimento socioeconômico ou pela maior concentração de dispositivos médico-assistenciais. “Devido ao aumento de volume e impacto financeiro despendido para o cumprimento das demandas judiciais no país, principalmente nesta região, ao longo da última década, ela foi considerada como lócus privilegiado de estudo de demandas judiciais, verificando diferentes gestões municipais.”
 
Para a pesquisa, foram selecionados quatro municípios de cada estado da região sudeste brasileira, perfazendo um total de 16 municípios, escalonados, por estado, pelos seguintes aspectos: aqueles que, nos últimos cinco anos, foram os mais afetados por ações judiciais
(em número absoluto); e os que sofreram com desastres e emergências sanitárias. Ambos os aspectos exerceram, de modo simultâneo, pressão sobre as contas municipais. Os municípios de pequeno porte foram excluídos, uma vez que a intenção era eximir casos de
municípios com menor capacidade de gestão e baixa disponibilidade de recursos da AF, o que foi relatado por diversos autores em relação a municípios muito pequenos. Foram contempladas as dimensões de recursos humanos, recursos financeiros e atividades da AF julgadas essenciais no estudo das demandas (procedimentos específicos para gestão das demandas, processos de aquisição de MedJus e dispensação de MedJus).
 
Os resultados da pesquisa observaram que em nove (56%) municípios, a gestão dos medicamentos e insumos solicitados por via judicial cabia ao gestor da AF local. Quatro (25%) gestores relataram que cabia a outro setor da Secretaria Municipal de Saúde a gestão das demandas, e três (18,75%) gestores sequer sabiam a qual setor competia a responsabilidade.
 
Na dimensão ‘Recursos Financeiros’, os indicadores do estudo demonstram que a maior parte dos gestores (75%) não soube informar os valores despendidos. Dos que souberam informar, quatro (25%) referiram que os valores despendidos eram maiores do que os valores mobilizados para a aquisição dos medicamentos previamente selecionados e programados. Esse  estudo  identificou  que  10  dos  16 gestores (62,5%) não souberam informar o montante de recursos financeiros mobilizado para compras classificadas como ‘emergenciais’. Entre esses dez gestores, dois relataram que o município gastava mais em compras emergenciais do que em compras regulares. Todos os gestores apontaram que os recursos financeiros para a aquisição dos medicamentos para o cumprimento de demandas judiciais e administrativas foram mobilizados do Tesouro Municipal ou do Fundo Municipal de Saúde.
 
Um alerta importante do estudo revela que a pouca ou quase nula comunicação entre os agentes do serviço municipal e o judiciário também se configura como uma chave importante na falha execução dos serviços mediados pela gestão da AF. “Essa situação se intensifica pela inexpressiva quantidade de pareceres técnicos, reforçando a inabilidade no manejo de tal atribuição, e contrapõe experiências exitosas, pontuais no país.”
 
Para as pesquisadoras, uma gestão com falhas e deficiências desfavorece a provisão pública de medicamentos. “A constatação de falhas primitivas no gerenciamento dos MedJus é preocupante, pois, inevitavelmente, as demandas se intensificam e, em se perpetuando a forma de condução, o sistema não suporta as necessidades da população.” Elas acrescentam que ainda que o entendimento do setor judiciário seja no sentido de fornecimento indistinto de medicamentos inseridos ou não nas listas oficiais, e obedecendo ou não aos arranjos federativos, a gestão da AF deve ocupar-se em cumprir as atividades do seu escopo, objetivando sempre a racionalização de recursos públicos, que são finitos; a segurança do paciente na utilização de diferentes terapêuticas medicamentosas, por vezes concomitantes; a garantia da manutenção dos estoques de forma adequada; e, especialmente, a aproximação com o judiciário local.
 
Por fim, o estudo aponta que os problemas da gestão municipal da AF vêm sendo apresentados e discutidos há anos, mas é fato que sua resolução não vem sendo suficientemente buscada. “Falta um olhar mais cuidadoso sobre a responsabilidade da gestão municipal e sobre a efetividade de serviços”, finaliza.
 
O artigo foi publicado na revista Saúde em Debate.

Fonte: Artigo Saúde em Debate
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