'Saúde em debate' questiona novo critério de classificação dos periódicos da Capes
A revista Saúde em debate de setembro, editada pelo Centro Brasileiro de estudos de Saúde (Cebes), trata dos novos critérios da Capes para classificação dos periódicos e a repercussão no campo da saúde coletiva. Em editorial assinado pelas pesquisadoras Maria Lucia Frizon Rizzotto, Ana Maria Costa e Lenaura de Vasconcelos Costa Lobato, a revista questiona o caso das revistas nacionais da área da saúde coletiva, cujo resultado da nova classificação, baseada no uso combinado de indicadores bibliométricos das bases Scopus (CiteScore), Web of Science (Fator de Impacto) e h5 (Google Scholar), no conjunto, rebaixou a qualificação dos periódicos.
O editorial lamenta que, nessa condição, de rebaixamento, insere-se a revista Saúde em Debate (RSD), com mais de 40 anos de circulação, que publica fundamentalmente autores brasileiros e latino-americanos, cujos temas estão direcionados aos interesses de leitores nacionais, com expressiva contribuição para o desenvolvimento do setor de saúde no país.
Sobre a nova classificação da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), o Fórum dos Editores Científicos das revistas da Fiocruz divulgou carta aberta denunciando que a adoção de critérios similares para avaliação de periódicos científicos é questionável considerando as profundas diferenças entre áreas na produção e divulgação do conhecimento, além de salientar que a adoção desses indicadores subordina a ciência produzida no Brasil aos ditames de revistas de outros países (USA e UK principalmente), favorecendo a priorização de temas de interesse da política científica do hemisfério norte, e afastar a ciência produzida no Brasil dos leitores não especializados.
A carta também, segundo a revista, destaca o papel dos periódicos na formação de profissionais da saúde em diversos níveis de pós-graduação e o impacto social dessa formação, que não pode ser avaliado pelas métricas adotadas pela Capes. Evidencia, ainda, uma série de problemas imediatos na aplicação da proposta da Capes
e conclui afirmando que as consequências dos equívocos da proposta são perfeitamente previsíveis: drenagem de artigos para áreas que conseguiram colocar seus periódicos nas classes A1 e A2 (e cujas taxas de publicação são razoáveis); diminuição da submissão de artigos oriundos de programas de pós-graduação bem avaliados, com mais recursos, para pagar publicação nas revistas das grandes editoras internacionais; restrição do financiamento das revistas, num processo de ‘mais para quem tem mais’.
A Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), o Fórum de Editores de Saúde Coletiva/Abrasco (do qual a RSD participa), a Coordenação da Área de Saúde Coletiva da Capes e a Coordenação do Fórum de Coordenadores de Programas de Pós-Graduação/Abrasco divulgaram documento intitulado ‘Critérios para classificação das revistas: apreciação da proposta de Qualis Periódico Referência’, que identifica um conjunto de problemas relativos aos critérios utilizados para a classificação das revistas e suas repercussões para a saúde coletiva.
O editorial da RSD aponta que no rol de problemas identificados para o campo da saúde coletiva, estaria a própria identidade da área e a sua política editorial. “O documento indica que os critérios de classificação dos periódicos podem produzir fuga de artigos científicos para periódicos de outras áreas (afins) com melhor qualificação; migra-
ção de periódicos da área de saúde coletiva para outras, cujos parâmetros lhe são mais favoráveis; subfinanciamento das revistas nacionais da área.”
Outro problema apontado no documento parte da análise de que concentrar a publicação da produção científica brasileira em periódicos de língua inglesa, dominantes nas bases consideradas no Qualis Periódico proposto, restringe o acesso desta produção aos leitores especializados. Limita, assim, o papel dos periódicos no processo de difusão de conhecimentos científicos atualizados, indispensáveis para subsidiar a formação nos diversos níveis e
modalidades da Pós-Graduação, assim como a formulação e a implementação de políticas públicas nacionais.
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Diante dos problemas identificados, o documento apresenta como sugestões: (1) a consti-
tuição de um grupo de trabalho com a finalidade de ‘aprofundar a discussão e elaborar uma proposta alternativa que melhor retrate a situação atual da área no País’; (2) Ampliar a discussão entre as áreas, visando a buscar critérios menos heterogêneos para a classificação dos periódicos; (3) Considerar no processo de revisão da proposta pelo GT referido a necessidade de incorporação de outras bases de indexação e, em especial, a Scientific Electronic Library Online (SciELO), assim como outros indicadores que captem melhor o perfil de internacionalização da produção científica da área e/ou valorizem a excelência da pesquisa localmente relevante; (4) Identificar ou desenvolver critérios qualitativos que possam ser incorporados à proposta alternativa a ser apresentada, que levem em conta, por exemplo, relevância para a área, volume de artigos/ano, história e o processo editorial.
As pesquisadoras salientam que a metodologia de avaliação de periódicos proposta
pela Capes, além de não atender às necessidades de difusão do conhecimento em saúde coletiva no Brasil, vem em momento de profunda restrição do financiamento público das pós-graduações e dos próprios periódicos. “Como atender a critérios mais rigorosos e alheios à área concomitantemente à redução de cerca de 50% do orçamento da Capes, como parece ser a proposta governamental para 2020?”, indagam.
Ressaltam, também, que o Cebes, ao criar a RSD, em 1976, teve como objetivo divulgar resultados de estudos e pesquisas, análises, reflexões e relatos de experiências que contribuíssem para o campo da saúde coletiva e para a formulação, o planejamento e a avaliação de políticas para o Sistema Único de Saúde (SUS). “Trata-se de uma revista conhecida e lida pelos gestores e trabalhadores da saúde e que, por essa razão, acumula enorme contribuição
na consolidação da política universal de saúde. Ainda hoje, quando a econometria direciona os projetos editoriais de muitas revistas acadêmicas, a RSD mantém-se firme nos seus propósitos de contribuir para a difusão de conhecimento científico aplicável ao setor da saúde. Desenha um futuro perverso para a RSD e outros periódicos da área de saúde coletiva”, concluem.
Para acessar a edição de setembro da RSD, clique aqui.
Fonte: Saúde em debate
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