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Entrevista: Pesquisadora da ENSP fala sobre recentes alterações nas políticas de AB e saúde mental

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Publicado em:22/03/2018
Com atuação em pesquisas acerca da análise de políticas públicas e as relações entre os três poderes e a saúde, Tatiana Wargas falou a respeito do discurso do Legislativo sobre a saúde e as recentes alterações nas políticas de Atenção Básica e de Saúde Mental. Ao mencionar o impacto da conjuntura na vida dos/as brasileiros/as, a pesquisadora apontou o que ela acredita ser o maior desafio para a academia: “Talvez seja o mais preocupante; não conhecemos e não sabemos as saídas possíveis. Nós, a academia, a classe média, estamos tão distantes da vida como ela é, dos grupos que estão sofrendo na pele tudo isso, que ainda não sabemos exatamente nem como lidar e reagir. Eu acho que esse é o maior desafio para os próximos anos e vai começar com a disputa eleitoral de 2018. Precisamos produzir mais conhecimento, mas nós precisamos conseguir produzir conhecimento implicado, inserido na nossa realidade socia,l e não tão preocupado com o impacto internacional, o que vai ser dito para fora do nosso país, mas principalmente o que vai ser dito para nós, o que precisamos produzir para nós”, disse Tatiana. A entrevista foi concedida ao Observatório de Análise Política em Saúde. Confira:
 
Sua trajetória como pesquisadora é marcada por questões que envolvem as relações entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário na Saúde. É possível afirmar que o discurso do Poder Legislativo está cada vez mais distante da Saúde Pública e próximo de interesses privados?
 
Entrevista: Pesquisadora da ENSP fala sobre recentes alterações nas políticas de AB e saúde mentalTatiana Wargas: A análise que eu venho fazendo do Legislativo  – e eu o estudo há longa data –, mostra que, na verdade, sempre tivemos um Legislativo distante das questões de Saúde Pública, isso já há algum tempo. Durante os anos 80, houve uma configuração bastante boa de aproximação de alguns personagens importantes da Saúde ao contexto legislativo, com parlamentares que eram vinculados à causa da Saúde Pública. Mas o que percebemos desde os anos 90 foi a diminuição gradativa da participação desses personagens e uma pauta de saúde pública saindo do debate gradativamente. Algumas produções minhas falam um pouco dessa diferença de atuação desses personagens do Legislativo, que sempre atuou com forte presença e parceria com o Executivo. O Executivo sempre foi muito atuante no âmbito legislativo, e eu fui mostrando isso, inclusive em projetos de lei e outras formas de intervenção. Então, o Legislativo sempre legislou muito voltado para os interesses do Executivo e as causas de Saúde Pública foram gradativamente diminuindo, tornando-se distantes no Legislativo. 
 
A própria Frente Parlamentar da Saúde é basicamente promotora de eventos e discussões que acabam falando de interesses da classe médica, das entidades médicas e dos empresários da saúde. Por certo, em período mais recente, esses interesses empresariais se tornaram mais importantes. Também é bom perceber que passaram a permear os interesses da Frente Parlamentar da Saúde outros interesses que têm a ver com bancadas religiosas. Por exemplo, a discussão do aborto é dificílima de se fazer dentro de interesses de saúde pública, porque a bancada religiosa está lá presente; a do financiamento é toda pautada por interesses empresariais da saúde, pois,quando se votou a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), claramente se viu isso. São coisas que estão aí colocadas.
 
Há, sim, a forte tendência conservadora no Congresso Nacional nos últimos tempos, e quando estamos falando do conservadorismo do Congresso estamos falando de interesses de outros grupos que fazem parte de pautas mais tradicionais, um tradicionalismo que dificulta questões de interesse da Saúde Pública, como, novamente, posso destacar o aborto. 
 
Como pautar e defender propostas favoráveis ao Sistema Único de Saúde (SUS) em um contexto no qual muitos parlamentares tiveram suas campanhas financiadas por empresas de planos e seguros privados de saúde?
 
Tatiana Wargas: É difícil mesmo, o cenário não é bom. Eu acho que, enquanto não mudarmos as regras do nosso sistema político e as formas de financiamento de campanhas, vai ser difícil quebrar com esse tipo de atuação e ter propostas favoráveis ao Sistema Único de Saúde (SUS). Na verdade, eu tenho dito que temos passado por uma Reforma Sanitária silenciosa, uma nova forma de reforma, ou seja, uma Reforma Sanitária ao avesso do que temos tentado construir nessas décadas todas.
 
Ela é financiada, capitaneada e alavancada por interesses empresariais. Quando a gente vê a proposta de planos populares de saúde e vê como se consolidou, nas últimas décadas, todo um sistema de saúde pautado em Organizações Sociais (OS), que não são OS de interesses da sociedade civil, são OS permeadas pelos interesses empresariais da saúde, há uma dificuldade muito grande de ver como reverter esse quadro. Então, para defender essas propostas favoráveis, é preciso repolitizar nosso debate, recolocar nossa agenda política da Reforma Sanitária, aquela que nós acreditamos, junto com os movimentos sociais. Nós nos afastamos dos movimentos sociais e precisamos, de novo, estar junto a eles, e não nos afastarmos mais.
 
Leia aqui a entrevista na íntegra.

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1 comentários
MARLON BARROS CARDOSO
22/03/2018 23:04
às vezes me perguntava por que um profissional de saúde deveria se envolver nos movimentos sociais e nas lutas dos trabalhadores. Agora sei que o direito à saúde é também uma decisão política muito além do acesso ao serviço ambulatorial e hospitalar. Todo o pacote de maldade implantado pelo governo do Vampiro Neoliberal afetará diretamente a saúde das pessoas que recorrerão a um SUS sucateado e depois migrarão para os planos de saúde "acessíveis". Não podemos permitir.