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Feminicídio em debate no Dia Internacional da Mulher

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Publicado em:09/03/2017
Feminicídio em debate no Dia Internacional da MulherFeminicídio. Essa é a abordagem da matéria da revista Radis sobre a cobertura de assassinato em Campinas, ocorrido em 1° de janeiro de 2017, que a ENSP destaca no Dia Internacional da Mulher. “A mídia e a sociedade brasileira se viram diante de um crime brutal, que expôs a relação direta entre o discurso misógino na sociedade e o assassinato de mulheres”, diz a revista. Em Campinas, São Paulo, Sidnei Ramis de Araújo, de 46 anos, invadiu a casa onde sua ex-mulher celebrava o Ano Novo com a família e abriu fogo. Isamara Filier, de 41 anos, e mais 11 pessoas morreram, incluindo outras 8 mulheres e o filho do casal, de apenas 8 anos. Em seguida, o atirador se matou. “O assassino deixou algumas cartas e áudios sobre sua atitude. O caso repercutiu amplamente na imprensa, embora poucos veículos tenham relatado o crime como feminicídio, crime de ódio baseado no gênero. O termo, popularizado pela autora feminista Diana E. H. Russel, em 1976, é a mais grave forma de violência contra a mulher e passou a constar na legislação brasileira como crime hediondo desde a Lei 13.104, de 2015”. De acordo com a matéria, o conteúdo da carta, divulgado textualmente, em trechos ou na íntegra, não deixava dúvida que se tratava de discurso de ódio. A intenção estava mais do que declarada: “Pegar o máximo de vadias da família juntas” (sic). A expressão “vadia” foi usada repetidas vezes se referindo à ex-esposa e suas parentes, às mulheres em geral, e até à Lei Maria da Penha (11.340/2006), que cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, além dos ataques às feministas que foram feitos. No discurso da carta, a violência se “justificaria” pelo fato de a mãe ter conseguido a guarda do filho em um processo que incluiu acusações de abuso sexual do pai contra a criança. Isamara teria registrado seis queixas contra ele ao longo de dez anos, entre 2005 e 2015, por agressão e ameaça.
 
“A boa prática recomendada, nesses casos, é divulgar de forma limitada e dar o principal enfoque às vítimas e à comunidade envolvida, assim como citar medidas preventivas, sem causar sensacionalismo”, lembraram a professora de Direito Penal e criminologia Luciana Boiteaux e o psiquiatra Luis Tóffoli, em artigo no site Nexo (10/01), questionando a divulgação, conforme relatado pela Radis
 
A publicação ainda traz a opinião da filósofa Márcia Tiburi, autora de livros que tratam de questões de gênero, que alertou, em entrevista publicada no site da BBC (5/1), para a responsabilidade da sociedade na barbárie de Campinas. “Ele não inventou esse assassinato das mulheres sozinho. Ele pode ter atirado sozinho, mas o que ele fez é simbolicamente muito mais grave”, afirmou. “Diante da atitude e da ´justificativa´ do assassino, muitos passaram a tratá-­lo como psicopata e enxergaram o caso como algo ´bizarro´, desconectado da realidade”, alertou Márcia. A filósofa discorda dessa visão. “Podemos analisar esse lugar do encontro entre a atitude particular e um contexto, percebendo a semelhança entre o discurso que ele profere e o discurso que a gente vê no senso comum. Esse indivíduo pensa a partir do senso comum.”
 
Feminicídio em debate no Dia Internacional da Mulher
 
Outro ponto de vista da reportagem da Radis é a observação feita por Manoel Olavo, psiquiatra e psicanalista, em artigo de opinião publicado na revista Carta Capital (4/1). “Nada nas cartas poderia sugerir um quadro psicótico agudo ou crônico.” Para ele, ao contrário, chama a atenção a “estranha familiaridade do discurso”. “A carta é um apanhado de quase todos os lugares comuns do pensamento de extrema-direita que tomou conta do Brasil nos últimos anos. A raiva, a misoginia, o horror ao feminismo, o desprezo à democracia, o discurso fanático anticorrupção, o ódio aos direitos humanos, ao Estado, a intolerância social, a glorificação da violência e dos militares. Está tudo lá. Seu ato monstruoso alimentou-se do ideário fascista existente entre nós”, registrou o médico. Para Márcia, todos devemos nos implicar nessa questão: “Eu, como professora de flosofia, acho que as pessoas não devem, nesse momento, achar que elas não têm nada a ver com isso. Elas têm algo a ver com isso, nós todos temos, porque todos nós participamos de uma cultura assim. Onde nós, como cidadãos, estamos errando? Esse cidadão pode fazer o que fez? Ele achou que estava acima da lei”, escreveu a pesquisadora.
 
A socióloga Wânia Pasinato e outros analistas na mídia defendem, segundo a Radis, que, mais do que apenas um crime, o feminicídio é emblemático de um momento e um tipo de pensamento político. A socióloga lembra que as políticas de desconstrução da cultura de intolerância de gênero estão ameaçadas. Concretamente, advertiu que, até maio de 2016, existia no país um Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos, com autonomia financeira e administrativa. Com a chegada do novo governo, aponta a socióloga, o Ministério foi dissolvido, em um primeiro momento e, posteriormente, suas secretarias foram reativadas no âmbito da pasta da Justiça e Cidadania. “Esse movimento resultou em perda de institucionalidade com a consequente perda de autonomia financeira e capacidade administrativa. Mas, principalmente, resultou em perda de força política, uma vez que as ações que eram coordenadas pelas respectivas secretarias foram paralisadas ou abandonadas”, registrou. 
 
Para ler a matéria na íntegra publicada na Radis de fevereiro de 2017, acesse aqui.
 
 

Fonte: Radis
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Divulgação Científica Radis

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