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No rastro da nova direita

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Publicado em:08/09/2016
*Por Raquel Júnia

No rastro da nova direita"Aumentou o número de militantes de direita que fazem trabalho de base”. A observação é da doutoranda em Ciência Política na Universidade de São Paulo (USP), Camila Rocha. De fato, até pouco mais de dois anos atrás, pensar em protestos no Brasil remetia a trabalhadores organizados, sindicatos ou movimentos sociais e alguns partidos políticos reivindicando direitos. A esquerda, num sentido amplo, era quase hegemônica na pauta desses grupos. Se a direita tradicional brasileira nos últimos tempos praticamente não deixava seus escritórios para operar a política, os novos grupos que ganharam visibilidade nas mobilizações pelo impeachment tiveram a capacidade de movimentar massas que fizeram das ruas um espaço de pressão e demonstração de forças. Reunidos sob o guarda-chuva da retirada de Dilma Rouseff da presidência, e com os aplausos dos partidos tradicionais da direita, as manifestações deram lugar a uma gama de pleitos em gradações diversas de conservadorismo – da intervenção militar ao Estado mínimo, passando por distorções caricatas do Partido dos Trabalhadores (PT) e da esquerda no país. Mas trata-se de uma nova direita? Seguindo os rastros dos principais grupos e ouvindo pesquisadores, a Poli mostra, nesta reportagem, que a resposta não é tão simples.

Para Camila, cuja tese de doutorado se dedica a analisar os think tanks e grupos de direita no país, de fato há o crescimento do que pode ser considerado um movimento neoliberal no Brasil. A pesquisadora explica que são grupos de diferentes vertentes, mas que se assemelham pela defesa de uma pauta econômica baseada no Estado mínimo e, portanto, na defesa da privatização, inclusive de serviços assegurados como direitos pela Constituição, como a saúde e a educação. “O interessante é que esse movimento ficou mais capilarizado. Nos anos 80 e 90 era quase aristocrático, porque circulavam nele grandes empresários, tecnocratas, personagens da elite política e empresarial, alguns professores acadêmicos. E agora, com a internet, se difundiu de uma forma mais enraizada na sociedade civil, principalmente junto a setores de classe média e universitários”, aponta. “Hoje é muito mais comum encontrar, mesmo entre aqueles que não são economistas, universitários que conhecem ou já ouviram falar de Von Mises, que é um dos intelectuais neoliberais, que há dez anos ninguém conhecia”, exemplifica.

Essa direita neoliberal, que se define por bandeiras essencialmente econômicas, não tem nada de nova. Mas, segundo Camila, a agenda dessas organizações e partidos mais antigos ‘colou’ muito bem com o discurso e a mobilização promovida por grupos como o Movimento Brasil Livre (MBL), Vem pra Rua e Revoltados Online – que se destacaram pela convocação das grandes mobilizações pró-impeachment. “O discurso contra o Estado acaba colando muito fácil num discurso contra o governo. E como o governo de turno era um governo do Partido dos Trabalhadores, com toda essa conjuntura de impeachment, de antipetismo, uma coisa acaba grudando na outra: ‘somos contra o Estado, então somos também contra esse governo estatista e corrupto”, salienta.

Origens e características

Para a pesquisadora Rejane Hoelever, organizadora do livro ‘A Onda Conservadora’, é preciso voltar ao contexto da ditadura empresarial-militar para entender a forma de atuação dos grupos que hoje podem ser chamados de ‘a nova direita brasileira’. A pesquisadora cita o Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais (Ipes) — uma organização criada em 1962 por empresários e que atuou na linha de frente no processo que resultou na deposição de João Goulart e na instalação da ditadura no país — como experiência prima desse know how adquirido pela direita e usado em algumas situações para a mobilização das massas. Já no final dos anos 1970 e 1980, houve também a criação de organizações como o Instituto Liberal, no Rio de Janeiro e o Instituto de Estudos Empresariais, em Porto Alegre, duas instituições que, apesar de se apresentarem por um discurso neoliberal, mais focado na discussão sobre o papel do Estado, têm estreitas vinculações com os novos grupos de direita da atualidade.

A pesquisadora considera que é possível fazer uma comparação entre essa nova direita e a que emergiu nos Estados Unidos nos anos 1970. “Guardadas as particularidades, aqui como nos EUA, temos um casamento entre um pensamento econômico ultraliberal e um reacionarismo do ponto de vista dos costumes, que é ligado aos setores cristãos fundamentalistas. Então, se você for analisar essas entidades, vai ver que, por exemplo, o ‘Vem Pra Rua’ não defende uma agenda conservadora do ponto de vista moral. Mas, na prática, quando eles vão para a rua, estão juntos com quem defende. E foram às ruas toda a fauna e flora da direita, até aquela direita mais tradicionalista como a ‘Tradição Família Propriedade’, os integralistas”, detalha.

Leia aqui a reportagem na íntegra.

*Raquel Júnia é jornalista da Escola Politécinica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). 

Fonte: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz)

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