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Fim da vida: discussão de políticas de saúde

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Publicado em:19/11/2012
 
Um debate sobre as políticas de saúde para o fim da vida sob os aspectos do cuidado, ético e jurídico. Essa foi a tônica do painel Por uma política de saúde para o fim da vida, realizado no segundo dia de atividades (17/11) do 10º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva (Abrascão 2012). A atividade contou com a participação do pesquisador e coordenador pela ENSP do Programa em Associação Ampla de Pós-Graduação em Bioética, Ética, Aplicada e Saúde Coletiva (PPGBIOS), Sérgio Rego. Segundo ele, é preciso propor a discussão de políticas de saúde que não se restrinjam apenas ao momento final da vida, mas que compreendam todo processo que o envolve.
 
Além de Sérgio, compuseram a mesa a coordenadora-geral da Área de Atenção Hospitalar do Ministério da Saúde (MS), Ana Paula Cavalcanti, e o membro da Comissão de Bioética e Biodireito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Bernardo Campinho. O painel teve a coordenação da professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Miriam Ventura da Silva. 
 
Para falar sobre o aspecto do cuidado, Ana Paula Cavalcanti iniciou sua fala apresentando algumas estratégias do MS para os cuidados paliativos e o processo de implantação das Redes de Atenção a Saúde (RAS) e as linhas de cuidado. Segundo ela, as linhas de cuidados são uma abordagem que promove qualidade de vida de pacientes e seus familiares em caso de doenças que ameaçam a continuidade da vida. Ana Paula destacou que a atenção básica é principal coordenadora do cuidado. Em seguida, a coordenadora falou sobre a presença dos serviços de cuidado paliativo no Brasil e no mundo, dividido em quatro grandes grupos com diferentes características. O Brasil faz parte do grupo III – o maior deles, com 80 países-membros – e é o único a oferecer serviços isolados de cuidados paliativos.
 
Fim da vida: discussão de políticas de saúde
 
O princípio dos cuidados paliativos inclui, entre outras características, a promoção do alívio da dor e de outros sintomas desagradáveis, além de afirmar a vida e considerar a morte um processo natural dela. “Não podemos curar o incurável, mas podemos controlar muitos dos sintomas que causam desconforto. Não podemos eliminar a dor da perda, mas podemos estar com aqueles que sofrem e partilhar sua tristeza”, destacou. A coordenadora também teceu observações sobre os locais onde são realizados os cuidados paliativos – casa ou hospital – e as desvantagens existentes em cada um deles. Segundo Ana Paula, 70% das pessoas expressam desejo de serem cuidadas em casa, porém apenas 54% dos pacientes e 45% dos cuidadores mantêm essa opinião com a evolução da doença.
 
Ana Paula apresentou ainda as características dos dois modelos de atenção existentes, tradicional e cuidado paliativo, que diferem entre si principalmente na forma do tratamento. O modelo tradicional possui uma abordagem biológica voltada para o tratamento curativo. Por sua vez, o segundo modelo trata principalmente da abordagem biopsicossocial e espiritual para o desenvolvimento de um tratamento paliativo. Por fim, a coordenadora questionou qual seria o melhor lugar para a realização de cuidados paliativos e ressaltou que o melhor lugar é aquele que oferece a melhor qualidade de vida ao paciente, respeitando sua autonomia. “A melhor de todas as opções é levar o cuidado paliativo ao paciente, e não o paciente ao cuidado paliativo”, concluiu.
 
Aspectos éticos e jurídicos das políticas de fim da vida
 
O pesquisador e coordenador do Programa de Bioética, Ética Aplicada e Saúde Coletiva pela ENSP, Sérgio Rego, destacou, no início de sua palestra, que é preciso debater propostas que não sejam restritivas apenas ao momento final da vida, mas sim que compreendam todo processo nele envolvido. Sergio indagou o porquê de debater o fim da vida em um congresso de saúde coletiva, já que o tema, visto pela maioria, deveria se restringir aos pacientes, aos familiares e à equipe médica envolvida no processo. Segundo ele, essa é uma discussão fundamental, pois se trata de um tema que necessita de políticas específicas. “É preciso discutir não apenas os direitos dos pacientes terminais, mas também as situações nas quais a morte é desejada”, afirmou Sérgio.
 
O coordenador enfatizou que não se trata de ignorar a Política Nacional de Humanização, mas sim de tornar o fim da vida uma questão concreta. De acordo com ele, os valores que norteiam a Política Nacional de Humanização são a autonomia e o protagonismo dos indivíduos, e a corresponsabilidade entre eles é o estabelecimento de vínculos solidários e a participação coletiva no processo de gestão. Em seguida, Sérgio entrou no mérito de quem determina quando e como alguém deve morrer. Segundo ele, cerca de 70% do total de 1,7 milhão de mortes que ocorrem nos Estados Unidos é decorrente da decisão de um indivíduo sobre não iniciar ou suspender alguma medida terapêutica. 
 
“Acredito que seja mais do que isso. As exceções seriam consideradas mistanásia, ou seja, morte miserável por falta de recursos materiais e humanos ou competência técnica. Em um tempo no qual está disponível a circulação extracorpórea, não está fácil morrer”, afirmou. Sérgio Rego destacou ainda que recentes estudos apontam um aumento de até 90% no emprego da limitação de suporte de vida (LVS) nos ambientes de terapia intensiva. “Isso também é uma realidade em estudos brasileiros, mais da metade das medidas de LVS correspondem apenas à ordem de não reanimar. Os estudos em pediatria revelam que, como na terapia intensiva adulta, até 72% dos óbitos nas unidades de terapia intensiva pediátrica foram precedidos por alguma medida de limitação”, explicou. 
 
Por fim, o coordenador listou alguns elementos para uma política de fim da vida: reconhecer que qualquer proposta não está situada em um vazio situacional; aprimorar a prática no Sistema Único de Saúde, que ainda é injusta e discriminatória; e criar mecanismos de proteção contra abusos e manipulações.
 
Encerrando o painel, o membro da Comissão de Bioética e Biodireito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Bernardo Campinho, apresentou o projeto do novo Código Penal e a saúde. Bernardo, que é atuante no debate jurídico das políticas de saúde para o fim da vida, ressaltou que a discussão do tema é ampla e complexa, pois se trata também de uma discussão que inclui princípios religiosos. 
 
De acordo com ele, o novo projeto do Código Penal define, entre outros aspectos, o tipo de pena para eutanásia – definida como matar por piedade ou compaixão paciente em estado terminal – e ortotanásia, processo pelo qual se opta por não submeter um paciente terminal a procedimentos invasivos que adiem sua morte, mas, ao mesmo tempo, comprometam sua qualidade de vida. Ela é focada na adoção de procedimentos paliativos, buscando o controle da dor e de outros. Por fim, Bernardo citou que o novo projeto prevê distinção de tratamento entre eutanásia e ortotanásia, com a descriminalização desta última.
 
(Fotos: Tatiane Vargas - CCI/ENSP)

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