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Pesquisa avalia como é possível melhorar o acesso e a adesão ao tratamento de tuberculose

O monitoramento constante e local dos pacientes com tuberculose durante todo o tratamento é fundamental para a identificação dos que enfrentam maiores dificuldades de adesão e acompanhamento. Essa é uma das conclusões da dissertação de Mestrado em Saúde Pública da historiadora Cláudia Santos Turco, apresentada na ENSP, no dia 4 de abril. "É importante reconhecer que algumas pessoas ou grupos necessitam de uma abordagem diferenciada, não para discriminá-los, mas para assegurar seu direito à saúde e à vida", enfatiza Cláudia. Veja a apresentação na Biblioteca Multimídia.

Realizada sob orientação de Rosana Magalhães, pesquisadora do Departamento de Ciências Sociais (DCB/ENSP), o estudo 'Desigualdades sociais, pobreza e cuidado à saúde: acesso e adesão ao tratamento da tuberculose em uma unidade de saúde no município do Rio de Janeiro' incluiu entrevistas com profissionais e grupos focais com pacientes de uma unidade integrante da rede básica de atenção municipal, que atende pacientes de classe média de dois bairros da Zona Sul do Rio e moradores de favelas existentes nesses mesmos bairros.

Práticas e políticas de saúde: como se dá essa relação

O vínculo com a Bem-Estar Familiar no Brasil (BemFam), uma organização da sociedade civil (OSC) atuante na área de tuberculose, levou Cláudia a se envolver em um projeto desenvolvido no estado de Pernambuco, de 2003 a 2007, ao longo do qual pôde vivenciar todo o investimento realizado na luta contra a doença e o compromisso de todos que buscavam soluções para os desafios enfrentados. A constatação de que, apesar dos sucessos obtidos, ainda havia muitos obstáculos a serem superados despertou o interesse de Cláudia pelo assunto. "Era visível o progresso na área de atualização dos sistemas de informação, na captação de sintomáticos respiratórios e na estruturação da rede de laboratórios, mas ainda eram baixos os percentuais de cura e altos os de abandono de tratamento. Isso me deixava perplexa", conta.

Segundo ela, foi essa experiência que a levou a buscar entender o processo de implementação da política de controle da tuberculose, principalmente no que se refere a aspectos relacionados a acesso, adesão ao tratamento e eqüidade. "Meu interesse foi buscar entender como o programa de controle da tuberculose se desenvolvia no âmbito de um serviço de saúde, ou seja, compreender a política na prática ou as práticas da política", explica.

Sobre a relevância do trabalho, a orientadora de Cláudia não tem dúvidas: "O estudo é um esforço sério e competente sobre os desafios presentes no processo de implementação local da política pública de controle da tuberculose no país", afirma. "Iluminando os limites do enfoque normativo e prescritivo sobre a organização da atenção básica, Cláudia mostra como os profissionais de uma unidade de saúde, em seu cotidiano de trabalho, refazem a política, mobilizando diferentes recursos, influenciando o processo decisório local e estabelecendo fluxos que impactam substantivamente o acesso e a adesão ao tratamento da tuberculose", completa, reiterando: "É uma experiência rica de pesquisa e um aprendizado para quem tem interesse no debate sobre eqüidade em saúde no país".

Sucesso dos programas de governo depende de diversos fatores

Em 2006, 159 pacientes iniciaram tratamento de tuberculose na unidade pesquisada. Destes, 64% aderiram ao tratamento supervisionado, enquanto os restantes permaneceram em tratamento auto-administrado. Em termos de resultado de tratamento, o motivo de encerramento para todos os pacientes de tuberculose da unidade, no primeiro semestre de 2006, foi 85,3% cura, 10,7% abandono e 4,0% óbito.

De acordo com Cláudia, a unidade de saúde pesquisada apresenta diversos fatores que facilitam a adesão ao tratamento, como horários flexíveis para atendimento e a distribuição de vale-transporte. A dificuldade na busca de sintomáticos respiratórios e de contato com os pacientes, principalmente em caso de abandono do tratamento, no entanto, ainda é um problema. "Os profissionais usam o telefone e o telegrama para tentar recuperar o paciente, mas reconhecem que essas estratégias não são eficazes. Uma opção tem sido o contato com as associações de moradores das favelas que divulgam a busca pelo alto-falante da comunidade. Eles, no entanto, acham que o ideal seria ter visitadoras no programa, que buscassem os pacientes em seus domicílios", diz a pesquisadora.

A falta de reuniões internas sistemáticas na unidade; a demora no retorno dos laudos de baciloscopia, de 15 a 20 dias, o que atrasa o início do tratamento; a necessidade de agendamento prévio do Raio X de tórax no serviço de referência foram alguns dos fatores considerados negativos. Além disso, não há busca sistemática de sintomáticos respiratórios nem dentro da própria unidade de saúde e nem na comunidade, e, também, não são realizadas campanhas ou atividades educativas.

Com relação ao acesso ao diagnóstico e ao tratamento, algumas características que resultam na entrada no sistema no estágio inicial da doença são: o conhecimento sobre a doença e o acompanhamento sistemático por um serviço de saúde, o que pode facilitar a identificação dos sintomas e a solicitação de exames de diagnóstico. E a pobreza, muitas vezes, faz com que a pessoa doente espere para buscar atenção somente quando não pode mais contribuir para a subsistência de sua família.

No que se refere aos pacientes, o estigma, o preconceito e a mudança de rotina de vida contribuem para a demora em procurar o tratamento e para o abandono do mesmo. "A tuberculose ainda é vista como uma doença ligada à morte e ao isolamento. Os doentes também se preocupam em ter que parar de trabalhar e de passar a doença para a família", relata Cláudia, completando: "Aqueles que têm seguridade social ficam com a sensação de falta de produtividade, mas os pacientes que não têm seguridade social vivem com o dilema de continuar trabalhando apesar da tuberculose ou de ficar sem renda própria".

No Brasil, o tratamento da tuberculose é oferecido de forma universal, com medicamentos gratuitos, e, onde está implantado, o tratamento supervisionado deve ser oferecido a todos os pacientes, ainda que nem todos aceitem. Infelizmente, na opinião da pesquisadora, se, para alguns doentes, o investimento do tratamento supervisionado não é necessário para um bom resultado, para outros, todo o investimento possível na unidade não é suficiente para que se chegue à cura. "Um paciente, sem família no Rio de Janeiro e que relatou uma alimentação precária, chamou minha atenção, porque, depois de um ano em tratamento, ainda apresentava baciloscopia positiva. Suas condições de trabalho impediam o tratamento supervisionado e até mesmo a presença nas consultas médicas, trazendo um grande sentimento de impotência para os profissionais da unidade", conta Cláudia, que lamenta: "A perplexidade que me levou à pesquisa ainda continua a me acompanhar".

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