Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca

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'Pesquisa retrata e discute paliativismo no Brasil

Traçar um panorama dos Cuidados Paliativos no Brasil e investigar o processo de construção da identidade dos médicos paliativistas no país. Esse é o objetivo do projeto apresentado pela pesquisadora e coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública da ENSP, Maria Cristina Rodrigues Guilam, à Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), e aprovado no programa de Auxílio à Pesquisa (APQ1) em 2007.

"O projeto é baseado na dissertação de mestrado de Mariana de Abreu Machado, que está sendo orientada por mim e co-orientada pelo André Pereira Neto, pesquisador da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz). Ele é fruto de um tipo de parceria que vem se fortalecendo na Escola e que envolve alunos e professores", ressalta Cristina. "Essa pesquisa não está isolada, ela se insere num conjunto de projetos que vêm sendo desenvolvidos na Fiocruz e que procuram compreender as modificações que ocorrem na profissão médica e quais os problemas e desafios que essas mudanças enfrentam", completa André.

A hipótese de Mariana (na foto, entre André e Cristina Guilam), que vem sendo confirmada nas várias entrevistas realizadas com profissionais que trabalham com Cuidados Paliativos, é que a medicina paliativista já é aceita como área de atuação, mas não como especialidade médica. "Eu conversei com médicos paliativistas de diferentes especialidades - clínicos, anestesistas, infectologistas, entre outros - e acredito que já está em curso um processo nesse sentido", afirma a especialista em psicologia oncológica, enfatizando a necessidade de formação de profissionais que possam contribuir com a formação de outros.

"Nós queremos saber o que esses médicos pensam sobre seu trabalho e sobre si mesmos; quais os dramas cotidianos que vivenciam no trabalho; que conhecimentos, competências e habilidades consideram necessários para seu exercício profissional; assim como, que motivações e desejos impulsionam sua escolha por uma filosofia de atenção à saúde que questiona o modelo médico hegemônico", detalha Mariana.

A pesquisa está sendo desenvolvida principalmente com médicos da Associação Brasileira de Cuidados Paliativos (ABCP) e da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), entidades associativas representativas do movimento paliativista no Brasil.

Objetivo é uma morte menos sofrida

De acordo com Mariana, a atitude do homem diante da morte se transformou lentamente ao longo dos séculos. No início da Idade Média, por exemplo, a morte tinha um caráter pouco dramático, sendo aceita como parte de um processo natural. A partir do final do século XVIII, no entanto, a morte passa a ser vista como algo negativo, que rouba o homem de seu cotidiano e de sua família. "A morte se transforma em tabu. Os médicos e as instituições de saúde passam a ser responsáveis pelos cuidados aos doentes. Já não se morre em casa, entre parentes, mas no hospital, sozinho. Tecnologias de alta complexidade são usadas pela medicina para prolongar a vida ou abreviá-la, sem, no entanto, haver uma preocupação com o alívio do sofrimento humano. Muitos doentes acabam condenados a uma vida vegetativa, ligados a tubos e aparelhos, com intenso sofrimento", conta.

Esse quadro, segundo ela, acaba dando origem a debates éticos sobre eutanásia (abreviação da vida por meio de intervenções médicas) e distanásia (prolongamento da vida por meios artificiais), bem como a movimentos sociais em prol da ortotanásia (morte no seu devido tempo) e da chamada 'boa morte', aquela em que o doente mantém a sua identidade social e é protagonista na tomada de decisões sobre o seu tratamento. É nesse contexto, de busca por uma morte menos sofrida e com uma maior autonomia por parte do paciente, que se desenvolve a idéia dos Cuidados Paliativos.

Prática exige um novo olhar do profissional

De forma simplificada, Cuidados Paliativos podem ser definidos como um conjunto de medidas que visam melhorar a qualidade de vida de pacientes com doença avançada e progressiva, que não têm mais possibilidade de cura, e de seus familiares. O foco, como explica Mariana, é o controle de sintomas e o alívio do sofrimento físico, social, psíquico e espiritual do doente. "A prática engloba uma visão mais holística do ser humano. É uma nova filosofia de trabalho que volta o olhar anteriormente dirigido apenas para a doença para o conjunto paciente-família", diz a mestranda.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) os nove princípios fundamentais dos Cuidados Paliativos são: aliviar a dor e outros sintomas que geram sofrimento; afirmar a vida e perceber a morte como um processo normal; não acelerar nem retardar a morte; integrar os aspectos psicológicos e espirituais na assistência ao paciente; oferecer um sistema de suporte para ajudar o paciente a viver da forma mais ativa possível até a morte; oferecer um sistema de apoio para ajudar a família a suportar a doença e seu próprio luto; empregar um enfoque de equipe multidisciplinar, visando a abordagem das necessidades de pacientes e familiares, incluindo a atenção ao trabalho de luto, quando pertinente; melhorar a qualidade de vida e influenciar positivamente o curso da doença; e serem aplicados no início da enfermidade, conjuntamente com outras terapias que buscam prolongar a vida, como quimioterapia e radioterapia, bem como com as investigações necessárias para compreender e controlar adequadamente complicações clínicas dolorosas.

Cuidados Paliativos no Brasil e no SUS

No Brasil, a história dos Cuidados Paliativos é relativamente recente e começa em 1983 quando o Hospital das Clínicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul anexa ao seu Serviço de Dor um Serviço de Cuidados Paliativos. Hoje, segundo Mariana, estima-se a existência de mais de 40 grupos dedicados aos Cuidados Paliativos em todo o país.

Sobre a questão dos Cuidados Paliativos no SUS, Mariana lembra que existe um grande número de doentes em estágio avançado porque nem sempre as estratégias preventivas ou de detecção precoce funcionam como deveriam. "Muitos pacientes oncológicos, por exemplo, quando chegam para atendimento já estão em estágio avançado da doença. Esse cenário tende a ampliar a demanda por tratamento paliativo em nossa sociedade e a estimula a existência de um movimento, uma tendência de se inserir os cuidados paliativos nas práticas do SUS", justifica. Ela destaca ainda que, apesar de os cuidados paliativos muitas vezes incluírem o uso de tecnologias avançadas para o controle e alívio da dor - medicamentos, procedimentos cirúrgicos, rádio ou quimioterapia -, a tendência é que eles sejam prestados majoritariamente na casa das pessoas, no domicílio dos pacientes, contribuindo para redução de custo de internações no Sistema. "É, portanto, uma proposta que pode vir a ser usada para reduzir os custos do sistema de saúde", ressalta Mariana.

Em 2002, o Ministério da Saúde, por meio da Portaria n. 19 de 13 de janeiro de 2002, instituiu, no âmbito do SUS, o Programa Nacional de Assistência à Dor e Cuidados Paliativos, incluindo os Cuidados Paliativos em sua agenda de saúde e, conseqüentemente, proporcionando um avanço no desenvolvimento do ideário paliativista no país.

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