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Segurança do paciente: eventos adversos podem ser evitados

As duas últimas décadas apresentaram crescente interesse social pelo tema da segurança do paciente. Despertados pela significativa ocorrência de eventos adversos em todo o mundo, gestores de saúde, profissionais da área do direito, a mídia, acadêmicos e muitos outros buscam debater, sob diferentes perspectivas, as consequências desses eventos para a sociedade. A experiência e o olhar europeu sobre esta questão, que já é destaque em nível mundial, foram apresentados pelo pesquisador português da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa, Paulo Souza, que proferiu, na ENSP, a palestra Segurança do paciente: um panorama europeu.

Nessa visita ao Brasil, Paulo Souza firmou parcerias com pesquisadores da Escola e com o Centro Colaborador para a Qualidade do Cuidado e a Segurança do Paciente (Proqualis), do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz), para projetos conjuntos. Entre eles, a tradução para o português de cursos on-line oferecidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS) na área de Segurança do Paciente e a construção da nova página eletrônica - Efeitos Adversos - que ficará hospedada no site do projeto Proqualis e será desenvolvida em parceria com o pesquisador do Departamento de Administração e Planejamento da ENSP Walter Mendes.

Em sua apresentação, Paulo Souza contextualizou o conceito de Segurança do Paciente, falou sobre a realidade da segurança do paciente em Portugal e na Europa, e ainda discutiu aspectos atuais e tendências futuras relacionados ao tema. De acordo com ele, a segurança dos pacientes hoje é reconhecida internacionalmente como um componente da qualidade em saúde. Confira, abaixo, a entrevista.

Informe ENSP: A Europa, em particular Portugal, está passando por uma crise financeira severa. Como o governo está lidando com o aumento da procura por cuidados de saúde, decorrentes principalmente do envelhecimento da população, e o consequente aumento da incidência e prevalência de doenças crônicas frente à desaceleração econômica e a natural contenção de investimentos em saúde?

Paulo Souza:
A partir dessa conjuntura, movimentos paralelos passaram a acontecer, como, por exemplo, a promoção da cultura de responsabilidade perante a sociedade (accountability) e a valorização de questões relacionadas à qualidade e à segurança do paciente.

Em Portugal, encontramos excelentes exemplos de alto nível de qualidade e de segurança do paciente, porém em locais isolados. De maneira geral, os sistemas de informações são frágeis, pois existem diferentes sistemas que não se comunicam entre si. O que gera muita informação espalhada, duplicada e de qualidade duvidosa. Também temos de lidar com a cultura da culpabilização e discriminação perante as "falhas" e suas consequências, a grande escassez de evidências na área da segurança do paciente, além de muitas falhas na organização de ações desenvolvidas no sentido de analisar as causas e diminuir ou eliminar as falhas.

Informe ENSP: Em Portugal, cada hospital desenvolve seu modelo de relatório de eventos adversos e define sua própria estratégia. O que mudou com a inserção dos programas de acreditação hospitalar?

Paulo Souza:
Este processo teve início em 2009 e envolveu sete hospitais. Já em 2000/2001, trabalhamos com outro grupo composto de nove unidades. Em 2002, formamos o terceiro grupo com quatro hospitais integrantes. Com este processo, tivemos avanços e alcançamos mudanças, como, por exemplo, no estatuto jurídico de algumas unidades de saúde. Há cerca de três anos, iniciamos quatro experiências-piloto em Centros de Saúde (USF) e, em 2010, conseguimos disseminar este modelo de acreditação a outras unidades de saúde de cuidados primários e aos hospitais.

Neste processo, trabalhamos com três modelos diferentes de acreditação e o que percebemos em comum entre eles foram padrões de qualidade explícitos em indicadores, que permitem monitorar as atividades. Além disso, todos eles têm a intenção de fazer com que a instituições de saúde reflitam a qualidade. Estes modelos incluíram padrões para a área da segurança do paciente referentes à medicação, infecção hospitalar, cirurgias, quedas etc.

Informe ENSP: Quais são os atuais indicadores de eventos adversos em Portugal?

Paulo Souza:
Dados da pesquisa Segurança do doente - eventos adversos em hospitais portugueses: estudo piloto de incidência, impacto e evitabilidade, realizada pela Universidade Nova de Lisboa em 2011, mostraram, entre outros indicadores, que, em 11,1% dos casos estudados, foi confirmada a ocorrência de eventos adversos (EA). E o que em especial chama a atenção é que mais de 53% dos casos de EA foram considerados evitáveis. A maioria das admissões nos hospitais foi feita pelas urgências (56,6%), e 3% delas foram de caráter emergencial. Nos outros 43,4%, a admissão foi eletiva. Cerca de 30% dos processos clínicos apresentaram critérios de positividade para a ocorrência de efeitos adversos.

Cerca de 60% dos indivíduos com notificação de EA apresentaram idade superior a 65 anos. Isso mostra uma variação na razão direta do aumento da idade. Outro dado importante é que 58,7% dos casos de EA tiveram o prolongamento da internação como consequência, estendendo o período por uma média de dez dias. O impacto disso pode ser observado em diferentes áreas, pois os EA levam à perda de confiança nas organizações de saúde, como também em seus profissionais; geram aumento significativo dos custos sociais e econômicos; e afastam os resultados em saúde daquele esperado, com consequência direta na qualidade do cuidado prestado. Em 2006, o custo individual total por dia de internação foi de pouco mais de €403,00. No Brasil, a ocorrência de EA chega a 7%, no Canadá 7,5%, na Suécia 12,3%, e na Nova Zelândia quase 13%.

Além disso, a questão dos eventos adversos é um tema muito caro à sociedade e extremamente valorizado pela mídia. Em Portugal, a saúde é a área de maior visibilidade social, e principalmente os erros médicos são divulgados de maneira dramática. A imprensa tem divulgado o tema de maneira mais regular e frequente, porém o foco é na culpabilização. Toda a teoria moderna é baseada na não culpabilização, porém a mídia e as áreas jurídicas trabalham no sentido contrário.

Informe ENSP: Como está a questão da segurança do paciente no cenário internacional e quais são as novas perspectivas para a área?

Paulo Souza:
A segurança do paciente está inserida no centro da agenda política de saúde. Além disso, dada a sua importância, houve grande incentivo para a criação de agências especializadas, como a Australian Patient Safety Foundation, National Patient Safety Agency, Danish Society for Patient Safety, entre outras; e também a implementação de um sistema nacional de notificação.

Nossa principal mensagem é que, com este atual cenário, se faz necessário o desenvolvimento de pesquisas sobre segurança do paciente. Outras áreas como financiamento, fortalecimento de intercâmbio nacional e internacional, além da melhoria dos sistemas de coleta e sistematização de informação, precisam ser mais bem desenvolvidas.

As pesquisas em segurança do paciente são de extrema importância, pois aumentam o conhecimento sobre o tema e, assim, podem dar apoio à tomada de decisões. Elas auxiliam também a promoção de práticas baseadas na evidência, o monitoramento e a avaliação da efetividade de medidas que visam aumentar a segurança dos doentes, como também a disseminação de informações de qualidade, como atua o Proqualis.

Confira o áudio e a apresentação da palestra na Biblioteca Multimídia da ENSP.

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