Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca

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Sociedade deve discutir patente de medicamentos

Filipe Leonel

No CEENSP que discutiu a concessão de patentes e anuência prévia da Anvisa, na quarta-feira (27/4), as palestrantes Marilena Cordeiro Dias Villella Corrêa, pesquisadora do Instituto de Medicina Social (IMS/Uerj), e Gabriela Costa Chaves, integrante do Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual da Rede Brasileira pela Integração dos Povos (GTPI/Rebrip) e membro da organização Médico sem Fronteiras (MSF), clamaram por maior participação dos diversos setores da sociedade, principalmente o da Saúde, na busca de diminuir o impacto das patentes e garantir o acesso da população aos medicamentos e à saúde. As palestrantes abordaram a entrada do país na OMC e os impactos gerados para a saúde e para a população, como o reflexo no preço, acesso e produção dos medicamentos. A atividade foi coordenada pela pesquisadora do NAF/ENSP, Cláudia Garcia Serpa Osório de Castro.

A difícil situação que a Coordenadoria de Propriedade Intelectual da Anvisa vem passando, em função do legítimo direito de examinar a patente de medicamentos, foi o primeiro tema abordado pela pesquisadora do IMS/Uerj. Após questionar a falta de amparo para "um dispositivo fundamental para a saúde pública" e cobrar uma posição mais efetiva do Ministério da Saúde, a palestrante explicou como o Brasil começou a conferir patentes farmacêuticas e alterar o estatuto de bem público do medicamento.

"O Brasil passou a conferir patentes farmacêuticas a partir do ingresso na Organização Mundial do Comércio (OMC). A OMC propõe o acordo Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (Acordo Trips), no qual todo país-membro deve reconhecer e proteger adequadamente os direitos de propriedade intelectual das outras nações associadas."

Marilena também revelou que o Brasil não só reconheceu patentes, como também abriu mão do seu direito de prorrogar a adequação da sua legislação e ganhar mais tempo, como fez a Índia, por exemplo. "Em tese, o país poderia ter esperado mais um pouco, como a Índia. A globalização do comércio via OMC e a submissão às suas regras corresponderam à globalização das patentes. No caso dos medicamentos, eles são de propriedade exclusiva dos grandes laboratórios internacionais e, para a saúde pública, isso traz consequências drásticas como o alto preço dos medicamentos, a dificuldade de acesso e o desinteresse no desenvolvimento de certo tipo de droga para as chamadas doenças negligenciadas."

"A patente afeta a vida das pessoas"

Marilena recordou que, em 1999, o Brasil emitiu uma medida provisória altamente inovadora e relevante do ponto de vista das políticas de saúde e de propriedade intelectual - que se tornou decreto em 2001 -, que foi a figura jurídica da anuência prévia. Para ela existir, segundo a palestrante, foi necessário alterar a Lei de Propriedade Intelectual de 1996. "Não apenas o quadro regulatório do patenteamento farmacêutico mudou, mas também a orientação política no âmbito do exame do pedido de patente de medicamentos. É muito simples entender que falta leito de CTI neonatal, por exemplo, mas não é tão simples entender por que um medicamento está mais caro e a relação disso com as patentes. Precisamos inovar! Precisamos convocar nossos pares para atuar em favor do acesso ao medicamento."


Na apresentação seguinte, Gabriela Costa Chaves afirmou que a premissa que sustenta a defesa do sistema de patentes é a de que, na verdade, se trata de uma troca entre público e privado. "Se, por um lado, o privado disponibiliza a informação sobre a invenção da patente, o público, por sua vez, confere monopólio temporário para a exploração daquela invenção no mercado." As promessas a favor do sistema, de acordo com ela, dizem que as patentes são a mola chave para estimular a inovação, que a propriedade intelectual vai gerar mais inovações, as quais irão beneficiar a sociedade como um todo, além de aumentar a transferência de tecnologia entre países produtores de tecnologias e países importadores de tecnologias. "Logo, todos se desenvolveriam", ironizou.

Em respostas para o acesso e inovação em um mundo com patentes, Gabriela disse ser necessária a inclusão das flexibilidades do Acordo Trips de proteção da saúde pública, como a licença compulsória, o reforço do papel do setor saúde no exame restrito dos requisitos de patenteabilidade e o efetivo uso das flexibilidades do Trips. "A patente afeta a vida das pessoas e por isso esse tema entrou na agenda da saúde. Porém, só percebemos quando o medicamento fica caro na ponta. Esse não é um tema para poucos discutirem. Todos devem se envolver."

Na saúde, todas as regras de propriedade intelectual e proteção patentária, de acordo com a palestrante, foram aprovadas no momento da epidemia do HIV/Aids, com o lançamento dos novos medicamentos para a doença. "Isso mudou completamente a configuração da epidemia. Não havia opções de tratamento, mas, a partir do momento em que um novo medicamento é lançado, os pacientes passam a se tratar e a ter melhor qualidade de vida. Porém, naquela época, os primeiros medicamentos de Aids eram vendidos no mundo por 10 mil dólares paciente/ano. No momento em que não há opções de concorrência no mercado internacional, o mantra de que isso é o custo da inovação vira verdade. E aí, muitos normalizaram o discurso de que é importante para incentivar a inovação, independente de ter pessoas morrendo."

Ao falar da anuência prévia, revelou que está em consonância com o Acordo Trips, que "admite que cada membro, ao formular suas leis nacionais, pode adotar medidas que sejam necessárias para a proteção da saúde e promoção do interesse público em setores de vital importância para seu desenvolvimento socioeconômico e tecnológico, como o é o setor de assistência farmacêutica."

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