Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca

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Comunidade científica discute proibição de anorexígenos

Antonio Fuchs

O Centro de Estudos da ENSP, realizado na quarta-feira, 30 de abril, apresentou um tema de extrema responsabilidade da saúde pública com relação à proteção social dos cidadãos: a proibição de anorexígenos proposta pela Anvisa. O debate mostrou o quanto a comunidade científica ainda está dividida sobre esta questão. O palestrante convidado foi o pesquisador da Escola Francisco Paumgartten, expondo os resultados da pesquisa internacional Scout sobre a efetividade e segurança do medicamento sibutramina, que serviu de base para a discussão.

Para melhor compreensão sobre a ação dos inibidores de apetites que ainda são comercializados no Brasil (sibutramina, anfepramona, femproporex e mazindol), o pesquisador Francisco Paumgartten ressaltou que a obesidade é um dos grandes problemas enfrentados pela saúde pública mundial, cuja prevalência é crescente nas últimas décadas, causando impactos para a área, seja nas estatísticas de morbidade de mortalidade associadas, como nos custos para o sistema de saúde. É considerada obesa a pessoa que possui Índice de Massa Corporal (IMC) igual ou maior que 30.

Segundo dados da Vigitel (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico) do Ministério da Saúde, até 2009, aproximadamente 14% da população brasileira era obesa no Brasil, número que segue em ascensão. "Esse é um grande desafio para o Ministério da Saúde, que tem que atuar firmemente em campanhas para diminuir o consumo de alimentos industrializados, combater o sedentarismo e fazer a promoção de hábitos nutricionais saudáveis. Somente assim vamos ter alguma melhora nos índices de morbidade e mortalidade do país e, consequentemente, diminuir os custos no SUS", disse o pesquisador.

Segundo Paumgartten, a abordagem para o tratamento da obesidade é a diminuição da ingestão calórica associada ao aumento do consumo de energia. "O tratamento da obesidade tem como objetivo prevenir ou atenuar morbidades associadas ao excesso de peso. Seu objetivo não é a mera redução de peso ou o alcance do peso ideal", afirmou. Ainda segundo o pesquisador, a indicação ao tratamento farmacológico deve ocorrer para os pacientes que não responderam ao tratamento com dieta hipocalórica e aos exercícios, e não tenham nenhuma contraindicação ao medicamento.

Sobre a efetividade da sibutramina e também de outros anorexígenos, o expositor lembrou que a perda de peso conseguida com esses medicamentos é modesta, geralmente acompanhada por uma recuperação de peso do paciente quando a droga é interrompida. Ademais, o anorexígeno não ajuda a formar um hábito alimentar novo e permanente, e os estudos de eficácia e segurança pré-comercialização limitam-se apenas a um ou dois anos de duração, cujas reduções da morbidade e mortalidade associada não são avaliadas como desfecho de eficácia.

Maior estudo sobre anorexígeno não revela eficácia do medicamento

Francisco Paumgartten apresentou os resultados do estudo pós-registro de longa duração para avaliar a efetividade e segurança da sibutramina, o Scout (Sibutramine Cardiovascular Outcomes Trial). Realizado por uma indústria farmacêutica, o estudo envolveu mais de 10 mil pacientes obesos com doença cardiovascular, diabetes tipo-2, ou com as duas condições. Entre os resultados apresentados em setembro de 2010, a sibutramina não foi eficaz em reduzir a morbidade cardiovascular e a mortalidade no estudo. Além disso, aumentaram em 16% os riscos de infarto e acidentes vasculares encefálicos.

Em contrapartida aos resultados, alguns especialistas argumentam que o estudo Scout investigou uma subpopulação vulnerável de pacientes obesos e a sibutramina poderia ser segura para pacientes que não tivessem essas comorbidades. "Embora o risco seja mais fácil de ser evidenciado em uma subpopulação com comorbidades pré-existentes, é plausível pensar que ele também exista para pacientes assintomáticos e com doença cardiovascular ainda não diagnosticada", ressaltou.

Na opinião do pesquisador, o argumento decisivo para a recomendação da retirada do mercado da sibutramina, em vez da adoção de uma estratégia de atenuação do risco, foi a indicação clara de que a droga foi ineficaz em reduzir as comorbidades cardiovasculares associadas à obesidade. "Se não há benefício comprovado, não faz sentido estabelecer estratégias de minimização do risco", concluiu.

Debates mostram divisão sobre a proibição ou não de medicamentos anoréxicos

Após a exposição de Paumgartten, o pesquisador da ENSP Luiz Antônio Bastos Camacho coordenou os debates com o público presente. A chefe do núcleo de monitoramento e avaliação em vigilância sanitária da Anvisa, Maria Eugênia Cury, afirmou que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária divulgou nota técnica sobre a eficácia e segurança da sibutramina e de outros três medicamentos, na qual recomenda a total retirada do mercado.

O parecer da Anvisa seguiu a recomendação da Cateme (Câmara Técnica de Medicamentos), instância consultiva da agência, da qual faz parte o pesquisador Francisco Paumgartten, que analisou uma série de outros estudos e meta-análises que concluem que os riscos da sibutramina e demais anorexígenos superam os esperados benefícios do seu uso no tratamento da obesidade.

Uma das questões levantadas pelo público foi sobre o dilema atual das autoridades regulatórias na questão da retirada desses medicamentos do mercado por conta dos riscos à saúde. Por que, então, tais produtos puderam ser comercializados? Existe a necessidade de se pensar a melhor estratégia pré e pró-registro das farmacovigilâncias.

Já a endocrinologista e doutora em saúde pública pela ENSP, Judy Botler, destacou que a obesidade é uma doença multifatorial, e o medicamento é um acessório que auxilia o paciente. Ela se diz preocupada quanto a uma decisão radical que apoie a retirada de todos os medicamentos do mercado, pois certamente haverá um comércio ilegal deles, sem garantia de qualidade nos produtos, não duvidando ainda do surgimento de diversos laboratórios e clínicas especializadas em colocação de balão bariátrico ou de cirurgias de redução de estômago, o que pode representar um risco ainda maior para a vida do paciente do que o uso de medicamentos inibidores de apetite.

Confira todas as opiniões expostas durante o debate no áudio disponível na Biblioteca Multimídia da ENSP.

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