Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca

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18 anos após reforma manicomial, ainda há casos de maus-tratos

Em reportagem publicada neste domingo (21/09), no Estado de São Paulo, o pesquisador Paulo Amarante (Laps/Daps/ENSP/Fiocruz) fala sobre o aparato de serviços sociais e comunitários da rede pública, que dá suporte ao atendimento ao sistema de saúde mental. Leia a reportagem a seguir:

18 anos após reforma manicomial, ainda há casos de maus-tratos

O Brasil está desativando os antigos manicômios, uma mistura de hospital, asilo e prisão, reduzindo gradativamente o número de vagas nesses locais - de 100 mil leitos há dez anos, há hoje 60 mil em funcionamento. No entanto, o sistema ainda não consegue, na mesma velocidade, criar novos leitos financiados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em hospitais-gerais ou nos Centros de Atendimento Psicossocial 3 (Caps), unidades de atendimento abertas 24 horas e com capacidade para internação.

Com isso, vive-se ainda uma fase de transição, com dois modelos funcionando simultaneamente. Há Estados sem leitos financiados e outros onde a proporção por habitantes é muito baixa. A conseqüência é uma assistência precária para casos agudos - nos quais a família procura o serviço para internar o paciente, já que não consegue conviver com ele dentro de casa - em muitas regiões.

"O aparato manicomial está sendo desmontado e uma rede de serviços sociais e comunitários está sendo criada, com um novo entendimento do que é tratar o usuário do sistema de saúde mental", afirma o psiquiatra Paulo Amarante, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e professor da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP). "Mas os novos serviços também têm problemas. O fato de não se cometer neles a violência que os antigos cometiam não significa que vão acabar com a doença e o sofrimento que ela causa", diz.

Segundo Amarante, é preciso redefinir melhor o papel dos Caps 3 e aumentar sua quantidade. Atualmente, de todos os tipos de serviço, é o que existe em menor quantidade, apenas 40 em todo o País. O psiquiatra também defende as enfermarias psiquiátricas dentro dos hospitais-gerais, ainda pouco aceitas por muitos profissionais.

Histórico

As críticas ao modelo antigo de tratamento psiquiátrico, onde os doentes mentais eram internados, alienados da sociedade durante toda a vida e, em muitos casos, sujeitos a atos violentos e negligência, deram origem a movimentos por mudanças radicais, no mundo todo.

No Brasil, no início da década de 1980, defensores de um tratamento mais humanizado, inspirados em mudanças ocorridas na Itália, iniciaram a luta antimanicomial que culminou, quase uma década depois, na reforma psiquiátrica aprovada no Congresso em 1989.

Mesmo assim, passados mais de 18 anos, os maus exemplos e a dificuldade em lidar com o doente mental permanecem.

Em 2006, uma blitz feita pela Ordem dos Advogados do Brasil juntamente com o Conselho Federal de Psicologia encontrou 38 instituições em todo o País que mantinham seus pacientes algemados, desnutridos, submetidos a maus-tratos e sem supervisão médica adequada.

No mesmo ano, a Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), condenou o Brasil pela morte de Damião Ximenes Lopes, portador de transtorno mental morto em decorrência de maus-tratos em uma clínica conveniada ao SUS em Sobral, no Ceará, em 1999. Foi a primeira condenação do País na Corte e o primeiro caso no qual a entidade considerou como violação aos direitos humanos uma agressão a paciente portador de transtorno mental.

Em São Paulo, a clínica psiquiátrica Charcot, na zona sul da cidade, virou o símbolo desse descaso. Há mais de seis anos foram constatadas condições inadequadas de tratamento no local. No início do ano, nova vistoria não encontrou mudanças. O cenário era formado por doentes amarrados, sujos e com roupas velhas, além de pessoas que já poderiam ter recebido alta.

O caso da clínica Charcot mostra como os modelos inadequados estão espalhados em todas as regiões do País, mesmo nas grandes cidades.

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