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Ambiência e vida: seminário agrega teoria e prática para discutir questões socioambientais

Realizado há pouco tempo na ENSP, o seminário 'Ambiência e vida' reuniu especialistas de diversas formações - o filósofo Emmanuel Carneiro Leão (UFRJ); o arquiteto e artista plástico Luiz Felipe da Cunha e Silva (UFRRJ); e os engenheiros Sara Silva Ramos (Cefet/ES) e Léo Heller (UFMG) - para discutir aspectos importantes da relação entre a vida humana e o ambiente. No evento, coordenado pelo engenheiro e psicanalista Jorge de Campos Valadares, pesquisador do Departamento de Saneamento e Saúde Ambiental (DSSA/ENSP), também esteve presente o presidente da Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (Feema), Axel Schmidt Grael. Os áudios e textos apresentados no seminário, bem como os debates realizados, estão disponíveis na Biblioteca Multimídia da ENSP.

O diretor da ENSP, Antônio Ivo de Carvalho, abriu o evento destacando a relevância do tema escolhido - "O tema desse evento está diretamente relacionado ao tema proposto para a Semana Comemorativa dos 54 anos da Escola: 'Saúde, ambiente e desenvolvimento: caminhos convergentes' - e a importância do seminário para todos os alunos e pesquisadores da Escola - "É sempre muito proveitosa a possibilidade de se ter contato com a experiência acumulada em outras instituições e poder refletir sobre as questões, a partir de outros referenciais".

Superação da crise ambiental depende do fim da dicotomia entre natureza e cultura

Na parte da manhã, o primeiro a se apresentar foi o filósofo Emmanuel Carneiro Leão, que trouxe para os presentes uma proposta de imersões e questionamentos referentes à relação entre cultura, civilização, história e tecnologias. "A minha proposta é refletir em que medida a técnica, por meio da tecnologia, responde pelas transformações e pelas mudanças radicais que ocorrem dentro do ambiente da vida", disse, complementando: "A suposição é que, assim como a tecnologia constitui o arcabouço de sustentação e de promoção do conhecimento científico, a ideologia constitui o arcabouço e a dinâmica de promoção dos conhecimentos referentes às ciências sociais e às ciências humanas. E nessa dualidade, nessa interconexão entre ideologia e tecnologia, se coloca um problema do pensamento que nos leva a algumas interrogações".

Em sua palestra, Carneiro Leão, discutiu a inter-relação entre ideologia, tecnologia e pensamento, a partir da articulação que se estabelece entre o papel, a função e o lugar da 'Terra' e o papel, a função e o lugar da técnica, aquela que constrói e elabora o 'Mundo'. "Temos uma correlação entre 'Terra' e 'Mundo', constituindo a alavanca de propulsão das mudanças e transformações da dinâmica histórica", afirmou.

Para ele, 'Terra' é mais que um lugar, ela diz que o homem é mais antigo que o 'Mundo', e que a técnica e, por outro lado, que a 'Terra' é mais antiga que o homem e que a história. "Essa inter-relação de anterioridade constitutiva entre 'Mundo', 'Terra', homem e história, estabelece um andamento, um ritmo de inter-relação problemática entre 'Mundo', homem, e 'Terra'", apontou. O filósofo terminou sua apresentação enfatizando a premência de se estabelecer a harmonia entre os três entes e o importante papel que a linguagem desempenha nesse processo.

O tema abordado por Luiz Felipe da Cunha e Silva foi a cidade como lugar de acolhimento e exclusão. Ele iniciou sua apresentação destacando a importância crescente que as questões referentes aos processos de urbanização assumem no mundo. "Neste início do século XXI, a população urbana superou a rural ao nível global e, embora as cidades ainda ocupem apenas 2% da superfície do planeta, seus habitantes utilizam 75% dos seus recursos naturais", ressaltou.

Segundo ele, já na emergência das cidades históricas, a intensidade com que o meio foi provocado pelas demandas do modo urbano de vida acabou gerando sérias crises ambientais e sociais que desencadeiam, entre outras coisas, a violência com a qual convivemos na atualidade. "Atualmente, no seio desta crise, emerge outra: a da violência inaudita que atravessa as cidades contemporâneas e esgarça o convívio social entre os homens e o convívio global entre as culturas", afirmou, enfatizando: "Torna-se insustentável o convívio do homem com o planeta e com o outro".

De acordo com Luiz Felipe, para se pensar a origem da crise ambiental, que coloca em cheque a sustentabilidade da vida ao nível planetário, é preciso se pensar na origem do urbano, que responde, segundo ele, ao mais profundo e ancestral desejo do homem: o desejo de habitar. A partir daí, o palestrante iniciou uma profunda reflexão sobre o papel físico e simbólico dos muros e aberturas que, como componentes estruturais essenciais das cidades, se "dispõem, sobrepõem, interpõem e contrapõem em inumeráveis dimensões e escalas", definindo limites e possibilidades de exclusão e inclusão social.

O arquiteto finalizou sua apresentação defendendo a idéia de que a superação da crise depende da tomada de consciência pelo homem daquilo que o move entre a natureza, que constitui seu corpo biológico, e a cultura, que o constitui como ser dotado de razão. "Nesse momento, o homem poderá distinguir o modo e as intensidades pelos quais faz uso da política e da técnica, entre o que é a salvação e o que é a destruição; entre o que são suas necessidades, o que são seus desejos de prazer e comodidade, e o que é gozo compulsivo de poder e consumo", concluiu.

Água: falta de acesso e ameaça de escassez

Primeira palestrante do período da tarde, a engenheira Sara Silva Ramos tratou de inúmeras questões sobre a água de consumo humano. De acordo com ela, existe hoje no mundo mais de um bilhão de pessoas que vivem com grande escassez de água potável e 2,6 bilhões de pessoas que não têm acesso ao saneamento adequado. "A água para a vida familiar e para a produção são as duas bases para o desenvolvimento humano. No entanto, essas bases são praticamente inexistentes para grande parte da humanidade. O acesso à água é uma necessidade elementar e um direito fundamental da vida humana", disse, destacando que, todos os anos, cerca de 1,8 milhões de crianças morrem por diarréia e por outras doenças provocadas pela água insegura para consumo e pelas más condições de saneamento.

Para Sara, as péssimas condições de saúde associadas à falta de água e de saneamento põem em risco a produtividade e o crescimento econômico, reforçando as profundas situações de desigualdade que caracterizam os atuais padrões de globalização. "As pessoas mais carentes são as que mais sofrem e a maioria delas não tem voz política para fazer valer os seus direitos de cidadãos. Assim como os países desenvolvidos, hoje também temos recursos tecnológicos e financeiros para superarmos a crise da água. O que falta são planos nacionais bem elaborados e devidamente financiados", disse. Segundo ela, tal como a fome, a água também é uma privação silenciosa suportada pelos pobres e tolerada pelos que dispõem dos recursos tecnológicos e de poder político para acabar com ela.

Léo Heller, por sua vez, trouxe para os presentes uma reflexão sobre os caminhos a serem percorridos pela pesquisa em saneamento, meio ambiente e recursos hídricos, em meio à crise do paradigma dominante na ciência moderna e à emergência de um novo paradigma, segundo o qual, todo o conhecimento científico-natural é científico-social, "todo o conhecimento é local e total, todo o conhecimento é autoconhecimento e todo o conhecimento científico visa se constituir em senso comum".

Ele destacou que é fundamental que a engenharia, definida como a arte de aplicar conhecimentos científicos, empíricos e certas habilitações específicas para a criação de estruturas, dispositivos e processos que se utilizam para converter recursos naturais em formas adequadas ao atendimento das necessidades humanas, aprenda a lidar e utilizar as novas tecnologias e métodos de forma a amenizar as questões relacionadas ao ambiente.

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