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Radis: reflexão sobre comunicação e saúde em seus 25 anos

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Publicado em:16/05/2006

“O Radis aproximou a produção científica e a saúde pública da população. Foi assim que a Fiocruz, a comunidade científica e a sociedade passaram a se relacionar mais de perto”, comentou o vice-presidente de Serviços de Referência e Ambiente da Fiocruz, Ary Carvalho de Miranda, na cerimônia de comemoração dos 25 anos do Programa Radis - Reunião, Análise e Difusão de Informações sobre Saúde, na ENSP. Rogério Lannes, coordenador do Radis, fez um breve apanhado sobre a trajetória do Programa. “Sempre trabalhamos com foco na comunicação, difusão de conceitos e idéias. Desde o início, o Radis ouviu e deu voz a todos os atores que escreveram a história da reforma sanitária”.

A comemoração dos 25 anos do Radis aconteceu no Auditório Térreo da ENSP, na quarta-feira (22/08), com as palestras O campo da comunicação nos últimos 25 anos, proferida por Muniz Sodré, escritor e professor da UFRJ, e O campo da saúde nos últimos 25 anos, pelo médico-sanitarista e professor da Unicamp Gastão Wagner. A programação incluiu ainda o lançamento do CD Radis 25 anos e de uma exposição sobre a trajetória do mais antigo programa de comunicação em saúde da ENSP.

Além de Rogério Lannes e Ary Miranda, também fizeram parte da mesa do evento a coordenadora da Pós-Graduação da ENSP, Maria Helena Mendonça, representando a Direção da ENSP/Fiocruz, o vice-presidente de Desenvolvimento Institucional e Gestão do Trabalho da Fiocruz, Paulo Gadelha, o vice-presidente de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico da Fiocruz, José da Rocha Carvalheiro, também presidente da Abrasco, e a secretária de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia do Município de Niterói/RJ, Jandira Feghali.

Maria Helena destacou a trajetória do Radis que, segundo ela, “é pontuada de fatos históricos de grande relevância para o Brasil e para a saúde pública”. Ary Carvalho, coordenador do Programa no fim da década de 80, lembrou que o Radis surgiu junto com o processo de redemocratização do país. “O Radis deu transparência à reforma sanitária. Foi e ainda é um espaço de discussão e difusão de idéias. Deu um salto de qualidade e, com isso, conseguiu se consolidar dentro da Fiocruz. Hoje, essa estrutura faz parte da Fundação”, ressaltou.

Jandira Feghali comentou que a Fiocruz e, em especial, a ENSP, sempre estão à frente de seu tempo, no que se refere à informação. “Para mim, a comunicação tem grande valor. Tanto que, meu primeiro projeto, no Senado, foi voltado para a comunicação”. Carvalheiro, por sua vez, falou sobre a representatividade do Programa na história da saúde pública: “O Radis foi um verdadeiro arauto das idéias que defendíamos”.

Rogério Lannes homenageou a equipe atual do Radis e todos os profissionais que passaram pela redação da publicação. O coordenador também foi homenageado pela equipe por seus 20 anos dedicados ao Programa.

O impacto da comunicação e das novas tecnologias na sociedade

Em sua palestra O campo da comunicação nos últimos 25 anos, Muniz Sodré falou sobre comunicação e sobre midiatização da sociedade. Segundo ele, a comunicação é resultado de um mal-entendido. "Se não existisse esse mal-entendido, não precisaríamos da comunicação”, explicou, tecendo, ainda, um comentário sobre a visão equivocada que a comunidade científica tem em relação à comunicação. “Os estudiosos de outras disciplinas vêem a comunicação como um conjunto de fragmentos de disciplinas. Essa perspectiva faz da comunicação um parasita, usada apenas como pretexto para resolver problemas de disciplinas”, disse.

Para Muniz Sodré, a midiatização da sociedade é “o grande fenômeno do século. É a influência dos novos dispositivos tecnológicos e virtuais incidindo sobre costumes e rotinas, pautando comportamentos e atitudes”. O impacto da tecnocultura tem, na opinião do pesquisador, transformado de forma veloz a vida das pessoas. Em sua opinião, o computador, a internet e as outras facilidades tecnológicas estão mudando o modelo de leitura usado nos séculos anteriores. “Esses equipamentos permitem uma série de possibilidades e, com isso, a informação fica descentralizada. A pessoa pode ler um texto na internet e abrir várias outras janelas de pesquisa enquanto ouve música. A leitura se tornou uma prática plural e heterogênea”, destacou.

Sodré citou a retórica – técnica de construção da fala empregada para ganhar discussões – como a primeira fonte de comunicação usada pelos gregos na antiguidade e lembrou que, ainda hoje, ela é usada como técnica de linguagem política. "Para a mídia, a retórica é um valioso instrumento. A mídia é a ampliação tecnológica da retórica”, disse. Segundo ele, hoje, não é possível fazer política pública sem levar em consideração as transformações e mutações que a sociedade vem sofrendo. Ele também destacou que "os avanços e as mudanças tecnológicas não estão ocorrendo apenas em países desenvolvidos; elas já chegaram a todas as partes do mundo”.

“A comunicação não é apenas a veiculação, a radiodifusão e a transmissão da informação. Ela representa o funcionamento articulado de instituições tradicionais com a mídia. Não existe um fato social sem ela. Quando a informação chega à população, ela já está midiatizada. Hoje, a internet disponibiliza informação minuto a minuto. A mídia é imediata, instantânea e global. Antes, apenas Deus tinha esse poder”, ressaltou.

Sodré explicou que a produção ilimitada de acontecimentos dá lugar ao imediatismo. Com isso, o espaço de tempo tradicional, que permitia a reflexão, teria sido abolido. “O tempo, ou a falta dele, impede a possibilidade de o conhecimento ser interpretado pelos indivíduos. Não existe mais tempo para isso. A informação está à frente dos acontecimentos e da interpretação”. Para ele, hoje há a necessidade de um novo tipo de saber, um novo modo de inteligibilidade e um novo sistema de interpretação, que não podem estar ancorados nas ciências sociais do século XIX. “O futuro parece que recaiu tecnologicamente sobre o presente. E, por sua vez, o presente parece equivaler ao passado. Essa é a realidade da comunicação que vivemos hoje”, concluiu.


A saúde nos últimos 25 anos

Gastão Wagner, que falou sobre O campo da saúde nos últimos 25 anos, afirmou que o Programa Radis conseguiu uma dupla filiação: a de um jornal institucional e, ao mesmo tempo, um mensageiro crítico e construtivo do movimento sanitário brasileiro. O médico-sanitarista homenageou todas as equipes que sucederam essa coerência editorial crítico-construtiva do SUS, e ressaltou que o objetivo do sistema de saúde brasileiro é tentar fazer uma reforma não só das instituições de saúde, mas da concepção que temos de saúde.

Para Gastão, tentar compreender a criação do SUS, do Radis e do movimento sanitário pode ajudar a tentar intervenções futuras. Como médico-sanitarista, disse que tem um compromisso com a salvação das pessoas e que, apesar da dimensão de ciência e tecnologia no campo da saúde, ela também possui esse componente salvacionista, da vida, e, nesse sentido, é necessário ser anti-Nietzsche. “Em um de seus últimos livros, tem uma frase muito usada pelos nazistas que diz que os fracos devem perecer. Nós, da área da saúde, temos o compromisso contrário. Temos que esticar a vida o quanto pudermos, em defesa dos idosos, dos fracos, das crianças”.

O professor da Unicamp registrou quatro fatos marcantes dos últimos 30 anos que expressaram as mudanças e os avanços do sistema de saúde brasileiro. O primeiro deles está relacionado à criação de um sistema público de saúde com a tradição do socialismo, fora da lógica de mercado. O segundo fenômeno trata das mudanças de condição de vida e saúde, e dos instrumentos de intervenção sobre as condições de vida no Brasil. Mudanças que, para ele, invertem concepções sobre saúde pública ao longo do tempo. O terceiro fato teria sido a construção de uma política pública ampliada de saúde, que teve no SUS a sua marca mais importante. E o quarto momento demonstra a constituição de um pensamento crítico e prático, com grau de autonomia relativa sobre o estado brasileiro e a realidade econômica dominante.

Ao falar sobre as transformações das condições de vida e da C&T, Gastão lembrou que não houve grandes transformações paradigmáticas na saúde, mas sim, o aperfeiçoamento das intervenções. No entanto, essas mudanças, segundo o médico, vêm acompanhadas da medicalização da vida e de interesses de mercado. “O conflito entre as lógicas de mercado, as tecnologias de atenção à saúde e o interesse da saúde coletiva se exacerba no mundo inteiro nesses 30 anos. O conflito entre a medicalização, o consumismo e o pensar no direito à saúde faz com que haja, simultaneamente, uma tendência em diminuir o dano e uma pressão para intervenções desnecessárias”.

Os últimos 25 anos, segundo Gastão, também revelam a manutenção da desigualdade social. Em sua opinião, a urbanização, feita de forma degradada, dificulta a atuação da área de saúde. “Montar uma equipe da saúde da família em qualquer comunidade é complicado. Há uma elevação da esperança de vida no Brasil, há queda da mortalidade infantil, há diminuição da mortalidade por doenças infecciosas, mas esses dados não são evidentes em todas as classes sociais. Qual é a influência das políticas de saúde stricto sensu e do SUS nesse quadro paradoxal de saúde?”.

Ao falar do SUS, Gastão Wagner destacou que o sistema tem sido o principal eixo de operações das políticas de saúde brasileiras, e que produziu dois fenômenos favoráveis à saúde: a ampliação da rede de atenção individual e coletiva e a qualificação do chamado aparelho da saúde pública. “Por outro lado, o SUS avançou muito pouco em relação à saúde do trabalhador. Temos que fazer com que o movimento sanitário reconstrua as alianças institucionais e que consiga se comunicar com o conjunto da sociedade brasileira”, finalizou.


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Divulgação Científica Radis

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