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Centenário da UFRJ relembra dificuldades enfrentadas pelas universidades públicas

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Publicado em:17/09/2020
Por Danielle Monteiro
 
Este mês, a mais antiga instituição de ensino superior do país completou 100 anos. Celebrado no dia 7 de setembro, o aniversário da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) marca a longa trajetória de luta em prol da educação como base de crescimento da sociedade e remete aos inúmeros desafios enfrentados pelas instituições de formação públicas, que se tornam mais visíveis em tempos de pandemia. As universidades públicas vivenciam um contexto contraditório, no qual, ao mesmo tempo em que veem sua legitimidade crescer, por serem fontes fidedignas de informação, passam por severa crise, provocada pelo estrangulamento econômico somado à desqualificação de sua relevância social. A opinião é do professor, ex-reitor da UFRJ e integrante do Conselho Consultivo da ENSP, Roberto Leher. 
 
Centenário da UFRJ relembra dificuldades enfrentadas pelas universidades públicas
                      Foto: UFRJ
 
Uma das grandes dificuldades enfrentadas por essas instituições são os cortes orçamentários. Segundo o professor, entre 2011 e 2017, o orçamento de investimentos nas universidades públicas foi reduzido em 71% e, desde então, seguiu caindo. Em 2011, quando o sistema possuía 1 milhão de matrículas, alcançou perto de R$ 4 bi. Já em 2019, despencou para R$ 760 milhões, apesar de haver 30% a mais de estudantes no sistema. Até agosto de 2020, foram repassados apenas 6 milhões às universidades públicas. 
 
Para Leher, a situação foi agravada pela Emenda Constitucional (EC) nº 95, que alterou a Constituição brasileira de 1988 a fim de instituir o Novo Regime Fiscal. “Com a EC 95, o problema não está limitado ao contingenciamento, mas à queda do orçamento na Lei Orçamentária Anual (LOA). Desse modo, a meta de expansão até 2024, que previa um acréscimo de aproximadamente 500 mil estudantes, será inexequível. Além disso, as verbas da Capes e do CNPq derreteram. E o orçamento de 2021 confirma novos cortes nas universidades (redução de R$ 1 bilhão pelo menos) e também do CNPq”, alerta. 
 
Além dos cortes de verbas e recursos, foram proibidos concursos, extintos cargos técnicos e administrativos e criadas restrições para a nomeação de cargos de direção e assessoria. Medidas que, segundo o professor, enfraquecem as instituições e, somadas a tantos outros obstáculos impostos, estabelecem um longo e árduo conflito em prol da universidade e da ciência. “O maior desafio, na atual conjuntura, é perseverar na defesa da existência do serviço público de cariz republicano. Isso não deve esmorecer o engajamento das universidades nos grandes problemas dos povos, pois é justamente nessa frente que as universidades ganham legitimidade e credibilidade social e, por conseguinte, apoio social”, afirma.
 
As dificuldades ultrapassam o corte orçamentário, passando por questões como redução da autonomia universitária, exclusão de prerrogativas de autogoverno e fortes retrocessos na Liberdade de Cátedra, conforme observa Leher: “Mais de 40% dos dirigentes escolhidos não possuem legitimidade em suas comunidades.”
 
Uma instituição singular no mundo
 
Criada em 7 de setembro de 1920 pelo presidente Epitácio Pessoa, a UFRJ é a maior universidade federal do Brasil. Além da excelência na formação superior, desempenha importante papel no desenvolvimento econômico e social do país, com base no tripé Ensino, Pesquisa e Extensão. Nos últimos anos, cresceu e se tornou mais diversa, voltada para a sociedade e com o desenvolvimento mais amplo de pesquisas. “A Universidade Federal do Rio de Janeiro é parte do sistema universitário brasileiro; por sua história, pela qualidade de seus cursos de graduação, assegurada pela excepcional dedicação de seus servidores docentes e técnicos-administrativos e, ainda, pela interação com os demais estudantes e pujança de sua pesquisa e de seus programas de pós-graduação, é um dos pilares desse fabuloso sistema. Sem ela, o sistema nacional não seria o mesmo”, ressalta Leher. 
 
Ao longo de seus 100 anos de história, além de fundar um ethos universitário, com um modo de pensar e praticar a universidade pública inspirador para outras instituições, a universidade redimensionou novas frentes relevantes para a educação brasileira, como o Complexo de Formação de Professores, relembra Leher: “O lugar da formação docente foi elevado na estrutura acadêmica, e, com isso, a UFRJ difunde uma mensagem importante para as 200 mil escolas públicas brasileiras: as universidades estão juntas com vocês; queremos formar docentes como intelectuais organizadores da cultura; a educação básica é um compromisso assumido pelo conjunto da instituição.”
 
São muitas as conquistas e momentos marcantes da UFRJ ao longo de todos esses anos, segundo o professor. A universidade constituiu, em 1939, uma Faculdade Nacional de Filosofia, que reuniu o melhor da ciência da natureza e grandes quadros acadêmicos das ciências humanas e sociais, instituindo um ambiente intelectual novo de pesquisa, sendo desmembrada, definitivamente, no contexto da chamada Reforma Universitária de 1968. A UFRJ mudou a forma de produzir conhecimento em todas as áreas do saber, como no caso dos profissionais de saúde, articulando a formação científica básica com intensa atividade clínica nos hospitais universitários. Reuniu ciência e tecnologia como elementos indispensáveis para a soberania nacional. E afirmou valores democráticos em momentos difíceis, se firmando como a primeira instituição a realizar eleições diretas para reitor ainda na ditadura. “A Universidade Federal do Rio de Janeiro esteve junto com o povo nas causas mais nobres da Nação e ousou no pensamento em todos os domínios do conhecimento. Em suma, parafraseando Hobsbawn, a UFRJ fez tempos interessantes!”, conclui Leher.
 
 

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