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'Cadernos de Saúde Pública' destaca a perspectiva da Inovação Responsável em Saúde

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Publicado em:06/07/2020

'Cadernos de Saúde Pública' destaca a perspectiva da Inovação Responsável em SaúdeA revista Cadernos de Saúde Pública, de julho de 2020, que já está disponível on-line, traz como destaque artigo sobre a perspectiva da Inovação Responsável em Saúde (IRS), em tempos de Covid-19. “Seu uso possibilita examinar em que medida uma inovação reduz as desigualdades em saúde ao atender as necessidades específicas de um grupo vulnerável.” Além de avaliar se os meios para mitigar os impactos negativos de uma inovação estão disponíveis para os aspectos éticos, legais e sociais aplicáveis; e também, até que ponto uma inovação contribui para a sustentabilidade do sistema de saúde, dizem os pesquisadores.


A pandemia de Covid-19 é um dos problemas de saúde pública mais graves das últimas décadas, reforçam os autores do artigo, Hudson Pacifico da Silva, Robson Rocha de Oliveira, Renata Pozelli Sabio e Pascale Lehoux. “Embora muitos países tenham conseguido achatar a curva de infecção pelo SARS-CoV-2, a situação é particularmente grave na América Latina, região considerada recentemente o novo epicentro da pandemia segundo a Organização Mundial da Saúde.” Diante desse cenário, agravado pela inexistência de vacina ou tratamento eficaz contra a Covid-19, apontam os autores, diversas soluções têm sido propostas para o seu enfrentamento. “Tais soluções incluem testes para rastreamento e confirmação diagnóstica, intervenções não farmacológicas de alcance individual, ambiental e comunitário para reduzir a velocidade de transmissão do vírus e tecnologias para o tratamento dos pacientes.”


Os pesquisadores observam que, além de questões relacionadas à eficácia e à segurança dessas soluções, a rapidez com que elas têm sido desenvolvidas e disponibilizadas à população levanta também um conjunto importante de questões éticas, legais, sociais, econômicas e ambientais. Por exemplo, os testes diagnósticos, os medicamentos e as demais tecnologias contribuem para reduzir ou aumentar as desigualdades em saúde? As soluções propostas para monitorar os cidadãos violam seus direitos fundamentais à privacidade e à autonomia? Quais são os impactos dessas soluções para o meio ambiente? E em que medida elas são compatíveis com a sustentabilidade dos sistemas de saúde?


Eles acreditam que a perspectiva da IRS oferece elementos importantes para responder essas questões. Em primeiro lugar porque contempla um conjunto de atributos de responsabilidade que amplia a compreensão sobre o valor das inovações tecnológicas no campo da saúde. Em segundo, os atributos enfatizados pela IRS se referem não apenas ao produto em si, mas também aos processos de concepção e desenvolvimento das inovações e à organização que as produz e as disponibiliza aos usuários. Esses elementos permitem contemplar as características que condicionam os propósitos, as funções e os custos das inovações antes que elas cheguem no mercado e sejam adotadas nos serviços de saúde.


Contribuições da Inovação Responsável em Saúde no contexto da Covid-19


De acordo com o artigo, a IRS foi inspirada na literatura sobre Pesquisa e Inovação Responsáveis (RRI, da sigla em inglês), um campo de pesquisa surgido na última década sob o impulso dos estudiosos da inovação e dos formuladores de políticas de ciência e tecnologia. A RRI enfatiza abordagens participativas e inclusivas no desenvolvimento de soluções que sejam “eticamente aceitáveis, sustentáveis e socialmente desejáveis” no enfrentamento dos grandes desafios da sociedade. Mais especificamente, quatro requisitos processuais são enfatizados: antecipação de riscos, impactos e consequências das inovações; reflexividade em relação aos sistemas de valor e práticas sociais que regem a inovação; processos de desenvolvimento inclusivos; e capacidade de resposta aos conhecimentos, resultados e mudanças de contextos emergentes.


A IRS pode ser entendida como um esforço para adaptar os requisitos da RRI às especificidades do setor saúde. “Consiste em um esforço colaborativo em que as partes interessadas se comprometem a esclarecer e cumprir um conjunto de princípios, valores e requisitos éticos, econômicos, sociais e ambientais ao desenvolver, financiar, produzir, distribuir, usar e descartar soluções sociotécnicas para atender às necessidades e desafios dos sistemas de saúde de forma sustentável”. O quadro conceitual proposto por alguns autores adota uma perspectiva global dos sistemas de saúde e integra nove atributos de responsabilidade organizados em cinco domínios de valor, os quais devem ser considerados ao longo do ciclo de vida de uma inovação, tendo em vista o contexto onde os usuários pretendidos estão localizados.
 
Valor para a saúde da população


Segundo o artigo, embora uma tecnologia que gere benefícios individuais à saúde seja valiosa, inovações responsáveis em saúde devem, em primeiro lugar, aumentar nossa capacidade de atender às necessidades coletivas e combater as desigualdades em saúde. Os atributos desse domínio estão relacionados com as seguintes questões: inovação busca atender uma necessidade de saúde relevante na região onde estão localizados seus usuários?;  inovação foi desenvolvida considerando os meios disponíveis para mitigar seus impactos negativos em termos éticos, legais e sociais?; em que medida a inovação promove a equidade em saúde?


Considerando a gravidade da pandemia no Brasil e no mundo, afirmam os autores, pode-se argumentar que as soluções propostas para combater a Covid-19 são relevantes do ponto de vista sanitário. Entretanto, complementam, muitas delas foram provavelmente desenvolvidas sem que tenham sido previstos os meios apropriados para mitigar suas implicações éticas, legais e sociais, ao passo que a capacidade de se beneficiar da inovação pode variar entre os usuários em razão da situação socioeconômica, posição social ou capacidades individuais. Eles citam como exemplo os aplicativos de rastreamento de contatos, cuja finalidade é incentivar o auto isolamento de pessoas que tenham sido potencialmente expostas ao coronavírus. Um mapeamento recente mostra que pelo menos 47 aplicativos de rastreamento de contatos estavam sendo utilizados em 28 países, sendo que uma proporção considerável deles apresentava problemas de natureza ética: 23% dos aplicativos não tinham uma política de confidencialidade, 53% não divulgavam por quanto tempo os dados dos usuários ficariam armazenados e 60% não tinham medidas de anonimato declaradas publicamente.

Valor para o sistema de saúde


Conforme o artigo, este domínio chama a atenção para a extensão com que uma solução fornece uma resposta apropriada aos diversos desafios do sistema de saúde. Os atributos que integram este domínio buscam responder às seguintes questões: processo de desenvolvimento da inovação incluiu um conjunto diversificado e relevante de participantes?; inovação proporciona uma solução dinâmica para um desafio do sistema de saúde que é reconhecido como de grande importância na região onde será utilizada?; nível e intensidade dos cuidados exigidos pela inovação são compatíveis com a sustentabilidade do sistema de saúde?


Um desafio importante, apontam os autores, se refere à população idosa que vive em abrigos e casas de repouso, onde os impactos da pandemia têm sido especialmente graves. “Para enfrentar esse desafio, uma força-tarefa envolvendo especialistas na área de geriatria e gerontologia, além de profissionais com experiência na gestão de instituições de longa permanência para idosos, produziu uma série de conteúdos sobre o tema, incluindo protocolos a serem seguidos por estas instituições. Todos os conteúdos estão disponíveis gratuitamente no website da iniciativa (https://www.ilpi.me)”.


Valor ambiental


De acordo com o artigo, este domínio de valor destaca a necessidade de minimizar os impactos negativos das tecnologias em saúde sobre o meio ambiente ao longo de seu ciclo de vida. Estratégias para essa finalidade incluem, por exemplo, o uso de materiais recicláveis e não tóxicos, o uso eficiente de energia, o cumprimento das normas ambientais e o fato de que a inovação foi projetada para ser reciclada, desmontada, recondicionada ou biologicamente degradada, relatam os autores. “Mesmo soluções aparentemente imateriais, como softwares e aplicativos que utilizam inteligência artificial, têm um impacto ambiental considerável, pois dependem de meios digitais como computadores, telefones celulares e centros de dados.” Dessa forma, acrescentam eles, é fundamental considerar os impactos ambientais das soluções desenvolvidas para combater a pandemia, numa abordagem alinhada com o conceito de saúde planetária.
Por fim, o artigo conclui que, no contexto atual, caracterizado pelo rápido surgimento de soluções destinadas a combater a Covid-19, os fundamentos e conceitos da IRS convidam todos os atores envolvidos, interessados e afetados por essas soluções a refletir sobre os atributos de responsabilidade promotores do bem comum.


O artigo Promovendo o bem comum em tempos de Covid-19: a perspectiva da Inovação Responsável em Saúde é fruto do programa de pesquisa In Fieri (http://infieri.umontreal.ca/), sobre Inovação Responsável em Saúde, sediado na Universidade de Montreal (Canadá) e coordenado por Pascale Lehoux.

Para ler os demais artigos do CSP, clique aqui.


Imagem: setorsaude.com.br


Fonte: CSP julho

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