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Financiamento privado e características hospitalares no setor público aumentam chance de cesárea eletiva

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Publicado em:06/01/2020
Financiamento privado e características hospitalares no setor público aumentam chance de cesárea eletiva *Danielle Monteiro
 
Algumas características hospitalares estão estritamente associadas à ocorrência da cesárea eletiva (quando a mãe faz a escolha pela cirurgia cesariana sem necessidade prévia, como riscos para o bebê ou para a gestante e possíveis complicações na gestação e no parto) na Região Sudeste do Brasil. É o que aponta artigo publicado nos Cadernos de Saúde Pública, assinado pelas pesquisadoras da ENSP, Ana Paula Esteves-Pereira e Maria do Carmo Leal, em conjunto com os pesquisadores do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), Marcos Nakamura-Pereira e Maria Auxiliadora Mendes Gomes, e a pesquisadora da Faculdade de Medicina de Petrópolis, Laura Zaiden.
 
O estudo revela que o financiamento privado aumenta consideravelmente a chance de cesárea eletiva. Além do financiamento, algumas características hospitalares no setor público estão associadas com maior chance de cesariana eletiva, principalmente o volume de partos por ano e a localização do hospital em cidades não capitais. 
 
Os resultados apontaram prevalência de 45,7% de cesariana eletiva na Região Sudeste, atingindo 83,2% nos hospitais privados. Em hospitais estritamente públicos, a prevalência de cesarianas eletivas foi de 28,3%, sendo quase três vezes maior do que na França (10,9%) e quatro vezes maior do que na Holanda (6,9%). Já os hospitais mistos apresentaram uma prevalência de cesariana eletiva de 45,8%. “Pode-se levantar a hipótese de que o tipo de assistência prestada nesses hospitais seja semelhante para todos os partos, independentemente da fonte de financiamento. Isso implicaria haver uma forma de ´contaminação` dos índices habitualmente observados nos hospitais com financiamento público exclusivo, por conta da coexistência com o financiamento privado. Essa `contaminação` aconteceria pela replicação da forma de organização dos hospitais privados, com agendamento prévio de cesárea, tanto por desejo materno, como por comodidade médica”, explicam os pesquisadores. 
 
Com exceção da idade gestacional, todas as características obstétricas se mostraram associadas à cesariana eletiva. Entre as pacientes submetidas à cesariana eletiva, 14,8% tinham mais de 34 anos de idade e 65% possuíam escolaridade maior ou igual a 11 anos. Com relação às características obstétricas, 60,5% das mulheres não possuíam cesariana prévia à gestação atual, 64,7% eram de risco habitual obstétrico, 93,4% dos fetos estavam cefálicos, 14,1% eram obesas e 4,9% dos fetos eram macrossômicos. Quanto às características hospitalares, os dados mostram que as mulheres atendidas em hospitais privados, fora da capital e em hospitais com menos do que 1.500 partos por ano, tiveram maior prevalência de realização de cesariana eletiva. 
 
Os hospitais localizados fora das capitais não apresentaram, na análise ajustada para todas as variáveis, associação significativamente estatística para a realização de cesariana eletiva. No entanto, após a realização de ajuste apenas para as características clínicas e socioeconômicas, a chance de cesariana eletiva foi duas vezes maior, demonstrando que, em não capitais, outras características hospitalares possivelmente atuam para o incremento na prevalência de cesariana eletiva. “Entre os hospitais localizados em não capitais, os mistos apresentaram maior chance de cesariana eletiva independentemente do volume de partos/ano, quando comparados com os hospitais do SUS. Assim, podemos afirmar que só o fato de um hospital ser misto já potencializa a chance de cesariana eletiva, independentemente das outras características hospitalares”, alertam os autores.
 
O artigo também revela que os hospitais com mais de 3.000 partos por ano são os que apresentam a menor prevalência de cesarianas (35,7%), quando comparados com os hospitais com 1.500 a 2.999 partos/ano (49,3%) e com aqueles com menos de 1.500 partos/ano (57,1%). “Essa relação se mantém na estratificação quanto ao tipo de financiamento do parto, porém, observa-se que a diferença é maior nos partos pagos pelo SUS, em que há chances duas vezes superiores de cesárea eletiva nos hospitais com menos de 1.500 partos/ano”, afirmam os pesquisadores. Segundo os autores, a maior ocorrência de cesarianas em hospitais com volume abaixo da média pode ser creditada à necessidade de hospitais com menor volume de partos manterem seus leitos ocupados com pacientes que terão recuperação mais demorada e com maior reembolso financeiro ao hospital. “É provável que, em hospitais com reduzido número de partos/ano, a via de parto seja influenciada por questões organizacionais, como menor número de médicos por equipe, tomadas de decisão centradas em apenas um profissional, agendamento de cesarianas para o melhor fluxo do serviço, entre outras”, explicam os pesquisadores.
 
Para o estudo, foram utilizados dados da pesquisa Nascer no Brasil, realizada entre fevereiro de 2011 e outubro de 2012. Participaram da pesquisa 10.155 mulheres na Região Sudeste do país. 
 

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