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Entrevista: Pesquisador da ENSP/Fiocruz fala sobre reintrodução do sarampo no país

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Publicado em:10/07/2018
Luiz Antonio Bastos Camacho, pesquisador do Departamento de Epidemiologia e Métodos Quantitativos em Saúde da ENSP/Fiocruz, esclarece dúvidas sobre o sarampo. Recentemente, dois estados brasileiros apresentaram surto da doença (Amazonas e Roraima). A orientação é a vacinação. Pessoas de 6 meses a 49 anos devem procurar uma unidade de saúde levando a caderneta de vacinação. 

O sarampo é uma doença viral que pode causar graves problemas de saúde, inclusive pneumonia, cegueira, inflamação do cérebro e até mesmo a morte. A principal medida para prevenir a introdução e disseminação do vírus do sarampo é a vacinação da população suscetível, junto com a implementação de um sistema de vigilância de alta qualidade e sensível o suficiente para detectar de forma oportuna casos suspeitos.

Onze países do continente americano já notificaram casos confirmados de sarampo neste ano: Antígua e Barbuda, Argentina, Brasil, Canadá, Colômbia, Equador, Estados Unidos, Guatemala, México, Peru e Venezuela. Tendo em vista as contínuas importações do vírus de outras regiões do mundo e os surtos em curso nas Américas, a Organização Pan-Americana da Saúde da Organização Mundial da Saúde (Opas/OMS) insta os países e territórios a:

- Vacinar a população para manter uma cobertura homogênea de 95% com a primeira e a segunda dose da vacina contra sarampo, caxumba e rubéola em todos os municípios;

- Vacinar populações em risco (sem comprovação de vacinação ou imunidade contra sarampo e rubéola), como profissionais de saúde, pessoas que trabalham com turismo e transporte (hotelaria, aeroportos, motoristas de táxi etc.) e viajantes internacionais;

- Manter uma reserva de vacinas contra sarampo e rubéola e de seringas para controle de casos importados em cada país da região.
Fortalecer a vigilância epidemiológica para detecção oportuna de todos os casos suspeitos de sarampo e garantir que as amostras sejam recebidas por laboratórios dentro de cinco dias após serem tomadas;

- Fornecer uma resposta rápida frente aos casos importados de sarampo, com o objetivo de evitar o restabelecimento da transmissão endêmica (ou seja, que existe de forma contínua e constante dentro de uma determinada região). Uma vez ativada a equipe de resposta rápida, deve-se assegurar uma coordenação permanente entre os níveis nacionais e locais, com canais de comunicação permanentes e fluidos;

- Identificar fluxos migratórios do exterior (chegada de estrangeiros) e fluxos internos (movimentos de grupos populacionais) em cada país, a fim de facilitar o acesso aos serviços de vacinação, de acordo com os calendários nacionais de imunização.


Além disso, a Opas/OMS recomenda aos seus Estados Membros que aconselhem a vacinação contra sarampo e rubéola, preferencialmente com a vacina tríplice viral (sarampo, caxumba e rubéola), a todos os viajantes com mais de 6 meses de idade que não puderem comprovar vacinação ou imunidade. E é importante que isso seja feito pelo menos duas semanas antes de viajarem para áreas onde a transmissão do sarampo foi registrada.

Confira, abaixo, a entrevista com Luiz Antonio Bastos Camacho, sobre o sarampo.

Informe ENSP: O Brasil enfrenta uma epidemia de sarampo ou os casos estão concentrados em alguns estados?

Entrevista: Pesquisador da ENSP/Fiocruz fala sobre reintrodução do sarampo no paísLuiz Antonio Bastos Camacho:
Tecnicamente, quando temos um caso de sarampo cuidamos como um surto, pois trata-se de uma doença que se espalha muito rapidamente, e temos uma situação no Brasil de uma cobertura vacinal suficiente para evitar os grandes surtos. O último que tivemos foi no final da década de 90, em São Paulo e Rio de Janeiro, então, isso agora é improvável. O que temos são bolsões de suscetíveis, por causa da cobertura baixa, permitindo que a doença se espalhe e acometa os nossos suscetíveis. Neste momento, temos surtos localizados.

Informe ENSP: Como o senhor avalia a cobertura vacinal?

Luiz Antonio Bastos Camacho:
O problema da cobertura vacinal é que ele é um termo médio. Essa é uma grande dificuldade nossa, a qual chamamos de "cobertura administrativa". Temos uma população a vacinar e um número de doses aplicadas. Fazemos um quociente simples e vacinamos 80% da população. Esse é um termo médio, e ele não conta a história completa. Há outro conceito, que é heterogeneidade. A cobertura média acaba permitindo que determinadas regiões tenham um alcance mais baixo que a média; isso possibilita que o sarampo se espalhe. Basta vir um caso, atingir esses suscetíveis, e a doença se espalha rapidamente. Essa é uma propriedade do sarampo, com grande potencial de infecção. Não há nenhum vetor, a transmissão é de ser humano para ser humano, mas se espalha muito rápido.

Informe ENSP: Por que o sarampo é um vírus altamente transmissível?

Luiz Antonio Bastos Camacho:
E uma propriedade do vírus que a gente chama de patogenicidade. Ele é parente, muito próximo, do vírus da rubéola, que não tem a mesma capacidade de se disseminar como o sarampo, que tem uma capacidade de se expressar clinicamente, e é também poderoso. E muito mais fácil você identificar um caso de sarampo porque ele manifesta doença clínica. Diferente da rubéola, que metade dos casos não vêm à tona, fica subclínico. O sarampo, por sua vez, é infetante, ou seja, antes de você ter o exantema, quer dizer, antes mesmo de a pessoa ter as manchas na pele - que sugerem um diagnóstico -, o indivíduo já é infectante, ele já está transmitindo a doença.

Informe ENSP: Há dois anos, o Brasil recebeu o certificado de eliminação do sarampo. Como o senhor avalia esse retorno?

Luiz Antonio Bastos Camacho: Erradicação, podemos falar somente da varíola, pois erradicamos a espécie, e o vírus não circula em nenhuma parte do mundo. O sarampo nunca alcançou isso. A doença foi eliminada nas Américas, não tinha transmissão autóctone nas Américas, mas estavam sempre pingando casos importados da Europa, da Ásia e nosso Sistema de Vigilância captando rapidamente esses casos, detectando a cepa e sabendo da origem.

Quando, além dos casos que vêm importados, o vírus pega uma área onde tenham muitos suscetíveis, ele se sustenta, como aconteceu no Ceará, em Fortaleza, há cerca de dois, três anos. Aí, começou a ter transmissão autóctone, ou seja, de brasileiros para brasileiros naquela área.

Informe ENSP: Com relação à vacinação, caso o indivíduo não se recorde se tomou a primeira dose da imunização quando era criança, qual a orientação?

Luiz Antonio Bastos Camacho:
A orientação é se vacinar. A vacina é segura. Se for uma revacinação, é mais segura ainda. Então, a ordem é vacinar. Na dúvida, vá ao posto de vacinação. A orientação é para que pessoas de 6 meses a 49 anos procurem uma unidade de saúde levando caderneta de vacinação. Teremos também uma campanha nacional de vacinação em agosto.

O sarampo se espalha muito rapidamente. Dessa forma, as medidas têm que ser com muita agilidade, tanto no diagnóstico como na resposta de diagnóstico - que é a recomendação de vacina. Detectou um caso suspeito, não espera a confirmação. Vacina. Pois, até confirmar, aquele caso já contaminou outro. Uma investigação epidemiológica também é necessária, porque, às vezes, um caso é a ponta do iceberg.

*Com informações da Organização Mundial da Saúde (OMS).

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1 comentários
ISOLDA MENDES DA SILVA
10/07/2018 21:14
Ótima entrevista, vou divulgar.