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Método que aposta no diálogo com pacientes psiquiátricos reduz uso de medicamentos

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Publicado em:08/11/2017

*Por Luiza Medeiros

Método que aposta no diálogo com pacientes psiquiátricos reduz uso de medicamentosO diálogo, a escuta compreensiva e a valorização das experiências sócio-interacionais podem ser grandes aliadas do tratamento de pessoas que apresentam comportamentos psicóticos, favorecendo a redução do uso de medicamentos e a compreensão das causas do problema. Este é o fundamento do Diálogo Aberto, abordagem apresentada pelo psicólogo finlandês Jaakko Seikkula, no segundo dia do seminário internacional A Epidemia das Drogas Psiquiátricas: Causas, Danos e Alternativas, realizado entre os dias 30 de outubro e 1 de novembro de 2017, na Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz). O pesquisador abordou o comportamento psicótico e os atuais desafios para o tratamento, dizendo que o comportamento psicótico é mais comum do que se pensa. "Não acredito na existência da psicose enquanto categoria clínica. Não há nada que defina que essas pessoas que apresentam comportamentos psicóticos sejam qualitativamente diferentes das pessoas que não apresentam", afirmou Jaakko.

Ele defendeu que os sintomas psicóticos muitas vezes podem não estar associados a uma doença, mas a uma estratégia psicológica para enfrentar uma situação de estresse. "A psicose pode ser um comportamento reativo natural. O importante é entendê-la como uma reação a algo que aconteceu na vida do paciente, que, por não encontrar outros meios de lidar com aquilo, desencadeou aqueles sintomas".

Uma abordagem clínica inadequada, segundo o pesquisador, pode prolongar os sintomas psicóticos. "A maioria dos tratamentos começa tardiamente. O nosso sistema de cuidados não está organizado de modo a tratar os pacientes precocemente. Geralmente, a pessoa fica psicótica dois ou três anos antes do primeiro diagnóstico. Dessa forma, a mente dela começa a criar estratégias de sobrevivência que, muitas vezes, a isolam", explicou Jaakko.

Ele observou que, além do diagnóstico tardio, muitos tratamentos partem de um entendimento inadequado da vida humana, o que pode levar a uma resposta insatisfatória do paciente. "É errado pensar que podemos reduzir os problemas mentais ao reduzir as funções mentais. Não é assim que nós seres humanos somos construídos. Somos construídos para viver em uma interação contínua com parte do nosso corpo, nossa mente e o ambiente social", afirmou.

Pacientes retornam ao trabalho

Essa visão de que o comportamento humano é um reflexo da interação social fundou, nos anos 90, uma nova forma de abordagem clínica do paciente psiquiátrico: o Diálogo Aberto. Por meio de uma escuta ativa e recíproca, o método tem como princípios ajudar imediatamente o paciente, na tentativa de evitar os diagnósticos tardios; a perspectiva em rede, em que psicólogos, pacientes, familiares e amigos interagem com vistas à condução do tratamento; a flexibilidade e a mobilidade, para adequar o tratamento a cada caso; e o dialogismo, que é apostar na escuta compreensiva e garantir que todas as vozes da rede sejam ouvidas.

Na abordagem do Diálogo Aberto, convida-se a família e outras redes sociais dos pacientes para aumentar os dados sobre ele e tentar compreender as origens das reações psicóticas. "Nos concentramos na geração de diálogo para fazer ouvir todas as vozes nas reuniões terapêuticas. Os clientes são abordados como seres humanos em sua plenitude e não como sintomas", disse o pesquisador, explicando que o encontro pode ser conduzido por um terapeuta ou por todos.

"De forma concreta, significa que quando alguém começa a apresentar ideias psicóticas em uma reunião, é necessário observar o problema mais importante relacionado a essa resposta de comportamento psicótico. O psicólogo para tudo, observa e, em seguida, pergunta: O que você disse? Você pode me ajudar a entender um pouco mais sobre o seu problema? Dessa forma, há um diálogo sobre este problema, no qual se tenta explorá-lo", explicou Jaakko. O papel da medicação que altera o sistema nervoso central pode ser reduzido, o que, segundo o pesquisador, evita os efeitos nocivos dos remédios usados no tratamento de psicose e de depressão.

Uma pesquisa sobre a efetividade da abordagem do Diálogo Aberto em pacientes de Tornio, na Finlândia, mostrou que, em um período de cinco anos, 81% deles não apresentavam sintomas psicóticos persistentes e retornaram ao emprego integral. Citando o filósofo russo Mikhail Bakhtin, Jakko ressaltou a importância do diálogo na constituição do ser humano. "A vida humana é um diálogo aberto. Viver significa participar de um diálogo. Nele, as pessoas participam de forma completa com olhos, lábios, mãos, alma, espirito, corpo e ações. O diálogo é a primeira e última coisa que fazemos. O diálogo não é somente comunicação, é o processo pelo qual nos tornamos humanos em relação a outros, e em relação às respostas do outro", concluiu Jakko.

Assista, no vídeo abaixo, a paletsra de Jakko na íntegra.

 

 

Experiências de desmedicalização no Brasil e nos países do Cone Sul
 

A tarde o seminário teve continuidade com a mesa Reforma Psiquiátrica e Experiências de desmedicalização no Brasil e nos países do Cone Sul. A mesa contou com a participação de Helena Rego Monteiro, Alejandra Barcala, Silvia de Riso e Rossano Cabral de Lima. A atividade foi coordenada por Cecília Augsburguer e Lucrécia Corbella fez a relatoria da mesa. Assista, no vídeo abaixo, a palestra na íntegra.

 


*Luiza Medeiros é jornalista do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz.


Fonte: Centro de Estudos Estratégicos (CEE-Fiocruz)

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