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Nada paga um sorriso: 'Radis' alerta para o possível desmonte do Programa de Saúde Bucal do SUS

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Publicado em:06/11/2017
Nada paga um sorriso: 'Radis' alerta para o possível desmonte do Programa de Saúde Bucal do SUSA edição n°182 de novembro de 2017 da revista Radis, disponível on-line, traz como reportagem de capa um dos problemas mais marcantes da saúde bucal no Brasil: a perda dos dentes. Também chamada de edentulismo ou mutilação dentária, essa ocorrência aponta para a necessidade de se pensar a saúde bucal pelo ponto de vista da integralidade — da prevenção e promoção até os cuidados de reabilitação, explica o repórter Luiz Felipe Stevanim, autor da matéria. Ele enfoca o caso de Sueli Lopes de Oliveira, vendedora ambulante de Campinas (SP), que começou a usar uma prótese dentária, e narra um pouco da mudança em sua rotina, marcada por anos de vergonha por ter que levar as mãos à boca para esconder o sorriso. “As pessoas não vão mais correr de mim”, conta, ao se referir aos olhares e reações que faziam com que ela se sentisse menos gente. De acordo com dados da Pesquisa Nacional de Saúde Bucal de 2010, 69% dos brasileiros adultos necessitam de prótese, sendo a maioria prótese parcial em um maxilar (41%). Mas, aprovada em 31 de agosto, pela Comissão Intergestores Tripartite (CIT), com apoio do ministro da Saúde, Ricardo Barros, a nova Política Nacional de Atenção Básica prevê que o governo federal possa financiar equipes que têm apenas médico, enfermeiro e técnico ou auxiliar de enfermagem — portanto, sem Equipes de Saúde Bucal (ESB).
 
De acordo com a reportagem, o contato diário com essa realidade aguçou o olhar da dentista responsável pelo serviço de prótese que fez a reabilitação de Sueli, no Centro de Saúde Dr. Luiz de Tella, na zona leste de Campinas, Ana Cláudia Pimenta: além de cuidar da reconstrução do sorriso, ela passou também a colher as histórias de pessoas que perderam os dentes, ao longo da vida, e como elas lidam com essa ausência e com os preconceitos decorrentes. 
 
“A boca não é feita só para mastigar. A boca se abre para o mundo. Ela fala, beija, sente, sorri. Não se separa a boca do corpo”, reflete, ao enfatizar que a saúde bucal está dentro de um contexto físico, psicológico e social. Os relatos — utilizados em seu doutorado em Saúde Coletiva, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), previsto para ser concluído no fim de 2017 — ajudaram a entender como a saúde bucal é reflexo das condições de vida das pessoas. Nas chamadas “histórias patográficas”, nome que deu a esses testemunhos, Ana Cláudia não estava interessada apenas nos prontuários, mas no modo como as pessoas lidam com a perda dentária. “Em geral as histórias têm um ponto em comum: a vida dessas pessoas é recheada de lutas e revela dificuldades para ter acesso ao postinho, aos serviços de saúde”, declara.
 
Ela também explica o “ciclo vicioso” que coloca o edentulismo como um grave problema de saúde pública. Até a criação do Brasil Sorridente, em 2004, o SUS não oferecia serviço de prótese, a não ser como iniciativa isolada de alguns poucos municípios. Obturações simples eram feitas em postos de saúde; mas para dentes infeccionados, que exigiam tratamento de canal, só havia uma sentença: arrancar. “Se tem que fazer um canal, o posto não faz, a pessoa não pode fazer particular, então se opta pela extração. Ou ela fica com dor ou ela tira o dente. Então ela escolhe tirar”, relata. Com isso, criou-se o que Ana Cláudia chama de “cultura da mutilação”, com uma consequência grave: uma parcela significativa da população passou a necessitar de prótese dentária. 
 
A reabilitação odontológica, por meio da prótese, é um serviço oferecido na atenção básica. A produção de próteses dentárias no SUS, que era de cerca de 60 mil em 2006, passou a ser de mais de 600 mil em 2014, com a criação dos chamados Laboratórios Regionais de Prótese Dentária (LRPD), uma das ações implementadas com o Brasil Sorridente. Atualmente professor da Universidade de Brasília (UnB) e coordenador do Observatório Ibero-americano de Políticas Públicas em Saúde Bucal, Gilberto Pucca Jr., que coordenou a Política Nacional de Saúde Bucal entre 2003 e 2015, considera que a área era tratada com descaso, porque não era um problema de todos, mas “apenas de quem não podia pagar por um dentista particular”. “Sorriso é um retrato de classe social. Naturalizou-se que o pobre não tem dente ou tem dentes estragados, e os ricos não. Por isso a saúde bucal era vista, e ainda é de certa forma, como supérflua”, afirma à Radis.
 
“Para onde vai o Brasil Sorridente?”. Essa é a questão levantada pela Radis. Se o desafio até então era expandir o número de Equipes de Saúde da Família (ESF) com saúde bucal, a nova Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) aponta no sentido contrário: abre espaço para que um município possa organizar suas ações de saúde pública sem a inclusão dessa área. É o que explica o professor da UFRN, Angelo Roncalli, ao definir em uma palavra as consequências da reforma da PNAB para a saúde bucal coletiva: “desastrosas”. "Retrocedemos 20 anos no tempo e a importante conquista que tivemos com a inclusão da saúde bucal na ESF literalmente desaparece”, alerta. 
 
Outro destaque importante é a entrevista que o pesquisador Paulo Capel Narvai concedeu à Radis, onde ele aponta a necessidade de inserir a saúde bucal em um modelo de integralidade. “As bocas de nossa gente refletem nossas iniquidades”, afirma ele.
 
Mais matérias de destaque estão disponíveis na Radis de número 182.
 

Fonte: Radis 182
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Divulgação Científica Radis

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