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'Violência no namoro deve entrar na pauta da saúde pública'

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Publicado em:25/11/2016
'Violência no namoro deve entrar na pauta da saúde pública'Apesar de passar despercebida entre jovens brasileiros, a violência no namoro pode ter papel importante na prevenção das violências de gênero e doméstica nas relações adultas. O tema, debatido no Centro de Estudos da ENSP (21/11), uniu pesquisadores brasileiros e mexicanos para expressar a universalidade do assunto e as diferentes formas pelas quais as violências física e emocional se manifestam entre jovens dos dois países. No México, com base numa amostra de 742 estudantes (56% de mulheres; 44% de homens), com idade predominante entre 15 e 18 anos, de Guadalajara, 32,5% confessaram ter participado de uma relação violenta. As mulheres foram maioria, 34,9%, contra 29,4% de homens. A violência intrafamiliar foi determinante para a ocorrência desses casos. "O caminho para uma relação violenta é curto. Você não percebe que tem namorado(a) violento(a) e vai naturalizando. Sob outra perspectiva, também é muito difícil os homens assumirem que são maltratados, sobretudo quando se trata da violência sexual. Essas posições contribuem para a invisibilidade desse fenômeno", reconhece a pesquisadora mexicana Maria Guadalupe Vegas Lopez.
 
Guillermo Julián González-Pérez, integrante da pesquisa internacional, completou. “Os estudos brasileiros e mexicanos coincidem em uma série de aspectos, mas, ainda assim, trata-se de um problema que, em função da sua invisibilidade, deve ser mais estudado. Não há muitas pesquisas sobre violência no namoro na perspectiva da saúde pública”, admitiu.
 
Logo em seguida, o pesquisador mexicano listou os tipos de violência emocional a que os jovens participantes do estudo estiveram submetidos. Segundo ele, 41% dos estudantes revelaram-se quase sempre zangados ou irritados com o namorado(a); 38,5% se sentiram controlados por ligações do parceiro no celular; 47,6% afirmaram que o parceiro diz sempre ter razão; 34,5% questionados por “dar like” em postagem de colegas no Facebook; 34% tiveram o celular revistado; e, sobre as formas de violência física, 31,1% sofreram marcas ao serem beijados.
 
“Devemos sempre estar atentos para os fatores que rodeiam a violência no namoro. A pesquisa mostra a internet como um elemento de controle, e ainda há a inspeção de celulares. Esse controle faz parte de uma violência emocional que não é percebida, apesar de estar muito presente. Normalmente, as pessoas esperam uma agressão física”, explicou Guillermo.
 
O palestrante elencou fatores associados ao status de vítima e agressor. Violência doméstica, um namoro violento anterior, faltar a escola e voltar com o mesmo parceiro após o término da relação foram mais determinantes para a condição de vítima. Em relação aos que perpetraram, ter mais de 18 anos e a ocupação do pai (trabalho não qualificado) foram importantes.
 
O caso brasileiro
 
As pesquisadoras do Claves/ENSP Kathie Njaine e Queiti Oliveira apresentaram resultados do estudo brasileiro realizado em 104 escolas, com 3.205 adolescentes (mais meninas). Segundo elas, praticamente 9 em cada 10 jovens praticam/sofrem variadas formas de violência (86,8% são vítimas e 86,9% são agressores). A violência verbal – a que mais ocorreu (85,3% perpetraram e 85% foram vítimas) – foi mais comum entre as garotas (foram mais vítimas e mais agressoras nessa forma de violência). Fazer ciúmes, dizer coisas ruins, provocar raiva, tom hostil, ameaçar terminar o namoro, depreciar, vigiar, culpar pelas coisas ruins são os exemplos. 
 
Sobre a violência sexual, a pesquisa revelou que 38,9% dos jovens perpetraram e 43,8% foram vítimas. O estudo, porém, não observou diferença entre os sexos na vitimização da violência sexual, diferente de outros trabalhos, em que mais garotas são vítimas. “No entanto, mais rapazes (49%) relatam praticar essa violência do que as meninas (32,8%). (Principais formas de agressão: forçar a beijar e tocar sexualmente o outro, quando este não queria)”, disseram as pesquisadoras. 

'Violência no namoro deve entrar na pauta da saúde pública'

No que diz respeito à ameaça (29,2% perpetraram e 24,2% foram vítimas), rapazes e moças informam igualmente sofrer ameaças dos parceiros. As meninas, por sua vez, comentam mais ameaçar seus parceiros (33,3% contra 22,6% dos rapazes). As formas relatadas foram: provocar medo no outro, ameaçar machucar, bater ou jogar algo na pessoa e destruir algo de valor. “As diferentes formas de violências estão interrelacionadas. As violências física, sexual e psicológica foram reconhecidas por 24,9% dos jovens que alternam os papéis de vítima e autor”, explicou Queiti.
 
Um dado preocupante indicado por Queiti e Kathie diz respeito à procura pelos serviços de saúde. Ao analisar os dados quantitativos, os adolescentes, independentemente de estrato social e de região do país, de forma rara procuraram ajuda em situações de violência no namoro ou no “ficar”. No total dos 3.205 jovens entrevistados, apenas 3,5% afirmaram já ter solicitado apoio profissional por causa de algum tipo de violência. Os amigos foram referidos, na maioria das vezes, como pessoas com quem contam para desabafar e trocar informações.
 
“Parece um tema banal, mas é corriqueiro na vida dos adolescentes. Falta noção do que é uma atitude violenta aos jovens, e os próprios profissionais de saúde reconheceram que devem se aproximar mais dos adolescentes, abrir portas, ouvir mais. Na saúde, já temos expertise da violência contra a mulher, de gênero, entre casais na vida adulta, e a violência no namoro não pode ficar fora da pauta da saúde. Temos que tentar resolver esse conflito desde cedo, e os jovens estão abertos, estão afim de conversar.”
 
“Se queremos diminuir a violência de gênero e intrafamiliar, temos que ir à violência no namoro. Esses são elementos comuns que preocupam nossos países”, finalizou Guadalupe.

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