Busca do site
menu

'É hora de o país se mobilizar'

ícone facebook
Publicado em:08/01/2016
'É hora de o país se mobilizar'"O grande potencial de doenças transmitidas pelos Aedes é fruto do nosso modelo de desenvolvimento de consumo capitalista, que sustenta fortes determinantes socioeconômicos para que o mosquito sobreviva às estratégias que vêm sendo usadas. Tecnologias serão insuficientes sem alteração nesses determinantes. A doença não acontece simplesmente, ela é produzida ativamente pela sociedade". A afirmativa é da pesquisadora Tânia Araújo-Jorge, do Instituto Oswaldo Cruz, que, no artigo "Foco no mosquito e no zika vírus", publicado no Correio Braziliense, na quinta-feira (7/1), destacou a necessidade de engajamento de todos os setores da sociedade para prevenção e controle do Aedes. "O Aedes não é problema só da saúde pública e das famílias em casa, mas de todos os setores da sociedade", alertou.
 
A pesquisadora também advertiu que é necessário manter e expandir as investigações, mas afirmou que os recentes cortes e ameaças de mais redução nos investimentos em pesquisa preocupam os pesquisadores.
 
O artigo cita ainda a iniciativa 10 Minutos Contra a Dengue, idealizada com base no conhecimento científico dos pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), e inspirado em uma estratégia de controle do Aedes aegypti adotada em Cingapura, que foi capaz de interromper o pico de epidemia no país com ações semanais da população dentro de suas residências, de apenas 10 minutos, para limpeza dos principais criadouros do A. aegypti.

Leia o artigo

"Foco no mosquito e no zika vírus" - Tania Araújo-Jorge (Correio Braziliense 7/1/2016)

A microcefalia, possivelmente associada ao zika vírus, com mais de 3 mil casos notificados e em investigação, implica mobilizar toda a sociedade.O mosquitinho rajado Aedes aegypti tem driblado as estratégias contemporâneas de controle e nos exposto a epidemia assustadora, além da febre amarela, da dengue e do novo chikungunya, que limita com intensas dores os movimentos, o trabalho e a vida de quem é acometido. 
 
Mero azar de quem pegou uma ou mais dessas infecções? Não. Epidemia anunciada, campanhas de informação verticais e pouco eficientes, ciência esparsa, mal sistematizada e aproveitada, e pouquíssima consciência coletiva.Mas não se engane o leitor, pensando que seja simples questão de falta de tecnologia de ponta, ou de negligência dos governantes de tal ou qual cidade (ainda que isso ocorra com frequência), ou de esperteza especial do Aedes.
 
Não. O grande potencial de doenças transmitidas pelos Aedes é fruto do nosso modelo de desenvolvimento de consumo capitalista, que sustenta fortes determinantes socioeconômicos para que o mosquito sobreviva às estratégias que vêm sendo usadas. Tecnologias serão insuficientes sem alteração nesses determinantes. A doença não acontece simplesmente, ela é produzida ativamente pela sociedade. 
 
Ponto central: se mudança de comportamento não é suficiente para o controle do mosquito, sem ela não há tecnologia que resolva. Praticamente não há mais desinformação a respeito dos criadouros do mosquito, mas os índices de infestação só aumentam. É hora de o país se mobilizar.OAedes não é problema só da saúde pública e das famílias em casa,masde todos os setores da sociedade. 
 
'É hora de o país se mobilizar'Os agentes de saúde sozinhos não dão conta do problema. Quando o país, que tem uma das mais avançadas legislações sobre descarte de resíduos sólidos do mundo, passará a ter coleta adequada e constante de lixo? Quando o acesso e o armazenamento de água nas grandes urbes serão regulares e mais iguais? Quando o crescimento urbano será ordenado, gerando ambientes saudáveis nos grandes e médios municípios?
 
E se as empresas assumissem sua responsabilidade social, conscientizando os consumidores sobre riscos de geração de microcriadouros de Aedes em tudo o que possa acumular água? Afinal, vêmda indústria automotiva os pneus; da indústria de eletrodomésticos, geladeiras, bebedouros, ares-refrigerados; da indústria de plásticos, vidros e metais, os recipientes que, descartados, se acumulam nos lixos a céu aberto. 
 
E se a educação brasileira incluísse o conhecimento sobre os mosquitos e outros vetores de importância no país, seu ciclo, seus hábitos e comportamento? As disciplinas e campos multidisciplinares da educação básica teriam na prevenção e controle do Aedes tema de aplicação transversal e interdisciplinar. O assunto seria integrado ao currículo de modo ativo, com pesquisaação da educação infantil à universidade. Monitoramento, vigilância, prevenção, consciência sobre os determinantes sociais e promoção de saúde seriam incorporados como ações coletivas, integrando todos os setores da sociedade, não apenas a saúde. A educação tem muito a contribuir.
 
Para mobilização e combate ao mosquito, a sociedade precisará se apropriar mais dos conhecimentos e das tecnologias sociais e educacionais já produzidas em teses e dissertações. As contribuições disponíveis poderiam ser amplificadas pela integração em
escolas, igrejas, clubes e outras tantas redes sociais ao processo de engajamento de todos contra o Aedes.
 
Dez minutos por semana são suficientes para monitorar os ambientes doméstico e profissional e para evitar o surgimento de criadouros de mosquitos. Esse movimento, lançado pelo Instituto Oswaldo Cruz em 2011, poderia ser visto como amplo convite a todo o Brasil, com as cartelas de checagem de criadouros potenciais sendo usadas por família e por empresa ou organização
 
A ciência vem estudando muitas estratégias, e é necessário manter e expandir as investigações. Os recentes cortes e ameaças de mais redução nos investimentos em pesquisa deixam os cientistas arrepiados ao pensar nos possíveis atrasos e retrocessos se tais medidas se concretizarem. Para tantas perguntas sem resposta, o Brasil precisa de consciência social e solidária e de ciência - muito boa ciência -assegurada pelos recursos que só o poder público pode mobilizar. Que nossos gestores sejam responsáveis. É o que esperamos.

 


Seções Relacionadas:
Zika Congênita

Nenhum comentário para: 'É hora de o país se mobilizar'