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As pupilas do senhor reitor

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Publicado em:17/08/2015

As pupilas do senhor reitorNão tem jeito. Coloca-se a cabeça à disposição da tal associação livre e é o título de um folhetim de segunda categoria que nos aparece ao sentarmos para escrever sobre a visita que Roberto Lehrer, recém empossado reitor da UFRJ, fez à ENSP. O professor foi o palestrante convidado da aula de encerramento do semestre do curso de mestrado Trabalho, Saúde, Ambiente e Movimentos Sociais. As pupilas, ideia que, a princípio, parece ruim, ganham uma chance. Olho a palavra pupila por outro ângulo. Sim, diz-me a Wikipédia, é ela, a pupila, a parte que no olho regula a quantidade de luz que passa para a retina. O professor Lehrer talvez goste da comparação, já que, diz-me o lattes, é lá da Biologia. Mas interessa mais o que o lattes segue a dizer do cidadão: é doutor e mestre em educação. Bom começo. Num pais em que dono de empresa de consultoria e de banco dá opinião como se economista fosse, pelo menos temos um educador a frente de uma das maiores casas educadoras do país: a Universidade do Brasil. A partir da experiência de quem está há algumas semanas em magnífico cargo, como pomposamente nos indica o pronome, mas há muitos anos estudando educação, Lehrer falou ao auditório internacional da ENSP lotado em dia de greve, como palestrante convidado da aula de encerramento do semestre do curso de mestrado profissional em Trabalho, Saúde, Ambiente e Movimentos Sociais.

E se de passagem de luz falávamos, é do próprio Lehrer que se ouviu um primeiro aviso meteorológico:

- É uma neblina fechada, densa. A atual conjuntura não tem seus determinantes no chamado estado nação. É por isso que a crise demanda conhecimento, para que tornemos pensáveis esses problemas.

Além de apontar a necessidade de um enquadramento maior, para que se compreenda de forma mais satisfatória a dimensão do monstro-crise, o reitor da UFRJ lembrou que os acadêmicos devem abrir o campo de visão dos seus telescópios.

- É uma preocupação metodológica: se queremos compreender saúde e educação temos que compreender a economia.

E em seguida, como quem sabe deixar o pensamento navegar em terras livres, faz-se história:

- O Brasil foi o último país da América Latina a ter universidade num determinado sentido em que as concebemos. São todas do século XX, mas se tornaram rapidamente relevantes em produção de conhecimento.

Nome aos bois e o ornitorrinco

- Vivemos no Brasil o que podemos comparar a um ornitorrinco, metáfora do sociólogo Francisco de Oliveira. No bicho, características múltiplas sugerem a convivência de diversos tempos evolutivos. No caso do Brasil, o que se vive é um ornitorrinco histórico. Um exemplo: há locais em que se cria gado com chip e a criação é monitorada desde a Alemanha, pela Wolkswagen. Na mesma atividade produtiva, em outros lugares, você encontra formas análogas ao trabalho escravo.

Boi biônico ou não, na opinião de Lehrer é preciso dar-lhes nomes adequados:

- Quando Eduardo Cunha está apresentando seu projeto, em nome de quem ele está falando?

Gaviões do FIES

- Nós temos a maior corporação educacional do planeta, que é o grupo Króton-Anhanguera, 1,1 milhão de alunos. Mas esse sucesso não foi erguido com a mão invisível do mercado. É ancorado no FIES. É claro eu concordo que qualquer educação é melhor que nenhuma educação, mas esse é um modelo de educação que se esgota.

Cosmovisão

Para Lehrer, no momento atual, diferentemente daquele que precedeu o gole de 1964, não se concebeu uma aliança entre uma burguesia nacional desenvolvimentista e os setores da esquerda. Portanto, a tarefa é buscar novos agenciamentos:

- Não temos aliados nas frações burguesas dominantes. Nossos trabalhadores é que são os aliados estratégicos.

O papel do conhecimento, para ele, é mais do que a formação de seres humanos ajustáveis à escala de produção do capital. E são os educadores que, como fazem as pupilas, regulam a quantidade de luz que chega ou não aos alunos, palavra que, diferentemente do que ventila a etimologia vulgar, não significa aquele “sem luz”, mas criança de peito, lactente.  Mas não se dá de mamar nem se atravessa a neblina com luz alta. A noite escura também tem seus direitos, principalmente para que se quer navegar orientado por estrelas.

- Vamos falar da construção da usina de Belomonte? Como pode participar de uma decisão sobre a obra um engenheiro, um agrônomo, um geólogo que não esteja aberto à cosmovisão dos povos que habitam aquelas terras por tantos anos?


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