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‘Formação obstétrica no Brasil deve atender à saúde da mulher’

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Publicado em:16/10/2014
Filipe Leonel

‘Formação obstétrica no Brasil deve atender à saúde da mulher’O primeiro dia (14/10) de debates da Conferência Internacional Ecos da 9th International Research Conference – Normal é natural: da pesquisa à ação debateu a formação obstétrica no Brasil, em mesa que contou com a participação do obstetra do Instituto Fernandes Figueira da Fiocruz Marcos Bastos Dias. O palestrante, que falou a respeito da sua própria formação, explicou a forma como a tecnologia passou a dominar os procedimentos médicos. "Fui formado num paradigma em que a instituição era poderosa. A ciência e tecnologia eram nossos deuses e ditavam comportamento. Foi preciso reinventar a minha formação. Caso contrário, estaria ancorado. Hoje sabemos que há necessidade de um olhar integral sobre a saúde da mulher".

Nessa linha, Dias relembrou o olhar sobre o parto naquela época, ainda na década de 80. “Muitas vezes, operar uma adolescente que sofria na hora do parto significava resgatar aquela jovem do sofrimento. A cesariana era vista como um ato de bondade do profissional para minimizar a situação de sofrimento e dor. Essa foi a minha formação”, disse o palestrante, para, em seguida, completar: “Imaginar uma mulher parindo em casa, com o bebê sendo retirado de forma natural, no próprio lar, estava associado ao passado. A percepção de quem tinha acabado de se formar era de que a liberdade da mulher e a possiblidade de ela parir com a ajuda do marido era um retrocesso. Nada disso condizia com a formação da época”.

O obstetra do IFF afirmou que essa situação começou a mudar a partir dos anos 2000, quando houve uma revolução na formação dos médicos e enfermeiros. “Tivemos, neste momento, uma inflexão das pessoas que trabalhavam com o parto no país. A Conferência Internacional de Humanização, em Fortaleza, mexeu com as universidades e trouxe evidências científicas que começaram a se impôr na prática. Sentíamos falta de um olhar integral sobre a saúde da mulher na formação dos médicos. Éramos capazes de pensar na infertilidade, na gravidez, no parto, mas, muitas vezes, sem entender a mulher como um todo nesses processos. Passou-se a questionar algumas condutas e a refletir sobre o que era efetivo ou não”.

Marcos Dias finalizou destacando o momento atual, no qual as evidências científicas acabam 'forçando' uma mudança das práticas, com equipes multiprofissionais, trabalhos colaborativos e um respeito maior aos direitos da mulher. “Aqueles profissionais que não conseguirem incorporar às mudanças na obstetrícia neonatal serão naturalmente excluídos do processo. Olho pra trás e vejo o quanto a gente caminhou”.

‘Formação obstétrica no Brasil deve atender à saúde da mulher’

Na apresentação seguinte, Nadia Narchi, da Universidade de São Paulo, falou sobre a experiência do curso de Obstetrícia da USP, criado em 2005, com o objetivo de capacitar e preparar profissionais aptos a implementar um modelo de atenção integral, humanizado, centrado na mulher e que promova e advogue pelos seus direitos sexuais e reprodutivos. “Alguns ainda estranham a existência desse curso e não compreendem a função desse profissional. Nossas obstetrizes são formadas e estão buscando seu espaço no serviço privado ou no SUS. Trabalhamos para transformar o nosso sistema de saúde. Muitas das dificuldades não dizem respeito à relação com as enfermeiras ou os médicos, mas à organização do sistema de saúde. Isso só vai se modificar com diálogo e a possibilidade de regulação e entrada das enfermeiras obstetras e obstetrizes no serviço”.

A Conferência Ecos, realizada de 14 a 16 de outubro, no Rio de Janeiro, tem por objetivo debater as estratégias reconhecidas em diversos países para ampliação do trabalho de parto, do parto e nascimento normais, bem como a garantia do protagonismo da mulher no que diz respeito aos seus direitos sexuais e reprodutivos.

 



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