INFORME ENSP

No dia 26 de março, a ENSP prestou uma homenagem ao pesquisador Miguel Murat, falecido em 8 de maio de 2009, aos 58 anos. Na solenidade, a Direção da Escola descerrou uma placa dando o nome do professor ao Ceensp, que passará a se chamar Centro de Estudos Miguel Murat Vasconcellos. Estiveram presentes o presidente da Fiocruz, Paulo Gadelha, o diretor da ENSP, Hermano Castro, a pesquisadora e viúva de Miguel, Ilara Hammerli, o pesquisador Alberto Najar, o professor Jairnilson Paim, a irmã de Miguel, Regina Murat, entre outros familiares e pesquisadores. A placa representa a dedicação de Murat ao fazer da Ciência e do Ensino espaços de defesa do direito universal à Saúde e ao Conhecimento.

  

Seu campo de ação na área da Saúde Coletiva tinha como ênfase a Tecnologia de Informação em Saúde, atuando principalmente nos seguintes temas: tecnologias de informação em saúde, planejamento e gestão de serviços de saúde, avaliação de serviços de saúde, tecnologias educacionais e educação a distância. Na ENSP/Fiocruz, Miguel coordenou o mestrado profissional de Gestão da Informação e Comunicação em Saúde, o curso de Especialização em Informação e Informática em Saúde e o curso, na modalidade a distância, de Processos de Gestão e Tecnologias de Informação em Saúde.

 

Na homenagem, Illara Hammerli destacou a trajetória profissional de Miguel, desde sua participação na implantação do Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento (PIASS), passando pelo Plano de Localização de Unidades de Saúde (PLUS), atuando na direção geral do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps) e na criação do Grupo Técnico de Informação em Saúde da Abrasco (GTISP), até chefiar o Departamento de Administração e Planejamento em Saúde (DAPS/ENSP).

  

Também participaram da homenagem o diretor do Centro de Relações Internacionais (Cris) e ex-presidente da Fiocruz, Paulo Buss, o ex-diretor da ENSP Antônio Ivo, o vice-presidente de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fiocruz, Valcler Rangel, a vice-presidente de Ensino, Informação e Comunicação da Fiocruz, Nísia Trindade, a vice-diretora de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico da ENSP Sheila Mendonça, a vice de pós-graduação Tatiana Wargas, a professora aposentada e coordenadora da Comissão da Verdade da Reforma Sanitária Ana Tambellini, o vereador Paulo Pinheiro e a antiga turma do Colégio Santo Inácio, onde estudou Miguel.

 

Confira abaixo os depoimentos de pesquisadores, amigos e familiares sobre Miguel Murat.

 

Paulo Gadelha - presidente da Fiocruz

 

"É gratificante a gente aprender e perceber uma série de menções sobre aquele que a gente conviveu ao longo de uma geração inteira. É nessa maneira de ser do Miguel que o conhecimento adquire uma relevância tão especial, que não é um conhecimento prepotente, de intimidação, é um conhecimento fraterno, acolhedor. A gente sentiu isso no Miguel várias vezes. O Centro de Estudos da ENSP é o lugar que se expressa melhor essa homenagem. Um lugar de inquietação, de produção do conhecimento, de encontro e de divulgação."

 

Hermano Castro - diretor da ENSP

 

"Eu tive a oportunidade de conviver com o Miguel, sob a direção do Antônio Ivo, nas mesas de debate do Conselho Deliberativo. Ali, eu pude conhecer Miguel Murat, talvez não em sua plenitude, nas suas argumentações,  mas certamente mostrando um espírito público acima de qualquer suspeita e sempre muito conciliador. Ele trazia a realidade pra todos nós. Ele tinha essa capacidade e isso é muito importante para um Conselho Deliberativo de uma Escola como a nossa, plural e diversa. Isso foi um ensinamento!  O melhor lugar para homenageá-lo é  representando o que nós expressamos na Escola: o conhecimento. E onde ele se difunde, se expressa e se divulga é no Centro de Estudos. Eu acho que esse é um lugar especial pra ele. Espero que a gente usufrua dos ensinamentos do Miguel!"

 

Ilara Hammerli - pesquisadora da ENSP 

 

"O Miguel é solar, acolhedor, hospitaleiro e irreverente. Sua trajetória caracteriza-se por intensa atuação  tanto em instituições de saúde quanto de ciência e tecnologia, tendo participação ativa em diferentes processos que contribuíram para a proposta do SUS. Quando nomeado diretor do Departamento de Planejamento em Saúde (Daps), integrando a equipe formuladora  nas ações integradas de saúde, conheci Miguel, que com sua inteligência aguçada, seus olhos azuis e seu charme, e sua convicção  que colaborávamos para a luta de redemocratização do país me encantou para sempre. Jamais Miguel se acomodou diante de situações que considerasse injustas. Miguel defendeu as ações integradas de saúde. Para ele, não bastava compreender a complexidade da saúde, era preciso mudar. Por toda sua vida Miguel conseguiu mesclar alegria, crítica aguda, compromisso e suavidade em seu oficio de servir."

 

Jairnilson Paim - pesquisador da Universidade Federal da Bahia (UFBA)

 

"Miguel dedicou sua vida toda a estudar. Estou comovido com as lembranças, com os depoimentos e com a poesia que circulou tanto em palavras como também em imagens e quero dizer que o Miguel vai além de toda formação cientifica, vinculada a ideais, a valores.Ele talvez tivesse algumas outras qualidades muito diferentes de nós todos. Ele conseguia transitar nos princípios da militância até o plano operacional. Ele conseguia fazer o círculo completo que é muito importante para nós da área da saúde pública e saúde coletiva. Aquele sorriso maroto e irônico de Miguel fazia parte também do jogo politico que ele realizava em defesa do projeto da Reforma Sanitária. É uma alegria, e ao mesmo tempo fico comovido . Desejo um pleno êxito para esse Centro de Estudos Miguel Murat Vasconcellos."

 

Maria Helena Magalhães de Mendonça - pesquisadora da ENSP 

 

"Miguel Murat tinha um forte espírito público, suas motivações tinham um misto de missão e prioridade para o fazer coletivo. O convívio com ele profissional e político por mais de 20 anos foi quase que diário. Concentrou-se em dois momentos e espaços institucionais: na fase pré-reforma sanitária (1984 – 1988), no Departamento de Planejamento em Saúde, do extinto Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social, por onde passaram José Gomes Temporão, Eleutério Rodrigues, Miguel Murat, Ilara Harmelli, Ziadir Coutinho e outros colegas da Ensp. Trabalhamos ali em torno da operacionalização de medidas que visavam conter a privatização da Assistência Médica e, especialmente, na formulação e implementação de um conjunto de normas e regras que propunham a integração das ações de saúde dos diversos níveis de governo, a famosa estratégia de Ações Integradas de Saúde e seu potente instrumento de planejamento de Programação e Orçamentação Integrada (POI). A rotina de reuniões departamentais, viagens de supervisão pelo Brasil, levando a ideia da reforma institucional, fóruns de debates interinstitucionais, elaboração de papers de posicionamento para Conferências de Saúde, significou uma ação política em cenário moldado pela alegria, juventude, afetividade e compartilhamento do desejo de transformação entre novos e velhos atores dentro da burocracia estatal. No momento pós-reforma sanitária (1992-2009), já redistribuídos para a Escola Nacional de Saúde Pública, vivemos uma fase mais reflexiva, de revisões críticas e aberturas de novas perspectivas de produção de conhecimento sempre para consolidar os propósitos da reforma, com práticas voltadas para o ensino, pesquisa e extensão. Foi tempo de aperfeiçoamento profissional e aprofundamento temático. Se eu segui nos estudos sobre a formulação e implementação de políticas, Miguel e Ilara criaram a linha de pesquisa ‘Informação e Informática em Saúde’ que formou, neste período, quadros técnicos e novos investigadores em comunicação, informação e uso de tecnologias de saúde, arejando as estruturas institucionais arcaicas da extinta previdência social e das secretarias de saúde. Na docência, pesquisa e na gestão do Departamento de Administração e Planejamento fomos colegas, nos cruzamos, alternamos posições de direção e coordenação, divergimos e nos identificamos. Ficam deste encontro além do apoio permanente, o privilegiamento de uma visão processual, que considera a história em seu processo e dinâmica social que conduz à mudança social e ao aperfeiçoamento das instituições, através de diálogo e respeito mútuo entre os diversos grupos de interesses, que supera contradições e retrocessos."

 

Alberto Najar - pesquisador da ENSP

 

"Ia escrever um texto sobre a importância do Miguel como pesquisador e estudioso das questões relativas à saúde, falar de nossa impressão sobre o status quo do Sistema de Saúde a partir de sua frase: medicina pobre para gente pobre, falar de nossas pretensões no Sistema de Informações da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (SIREM) e tantas outras coisas que eu tive o privilégio de compartilhar com ele aqui no convívio com a ENSP. Bom, eu desisti. Achei que ele não precisava disso pois se seu nome estava sendo dado ao Ceensp é justamente por sua importância. Resolvi então apenas registrar algumas coisas que compartilhávamos como amigos. Miguel gostava de árvores e plantas. Há alguns meses eu conheci uma árvore que certamente ele gostaria de ter conhecido também. Um jatobá cuja datação é de mais de dois mil anos. Eu fiquei pensando nele e no ipê amarelo que foi plantado em sua homenagem. Não poderia ser mais justa essa homenagem a quem deixou raízes e floresce constantemente."

 

Tânia Celeste Matos Nunes - pesquisadora da ENSP

 

"A homenagem da ENSP ao Miguel Murat dando nome ao Centro de Estudos da nossa Escola representou o sentimento dos seus colegas e amigos entre os quais me incluo, e tocou o nosso coração das boas lembranças do amigo e companheiro de tantas jornadas. Poderia citar inúmeras vezes que a vida nos colocou juntos nas batalhas pelo SUS: as reuniões semanais em Brasília para implantar as AIS na década de 80, também em companhia da sempre bela Ilara, a organização de um banco de dados dos alunos dos Cursos Descentralizados da ENSP, nos tempos da Concurd (anos 90), e mais recentemente, na organização de inúmeras atividades pedagógicas que juntava o seu conhecimento em tecnologias educacionais com a nossa experiência enspiana de implantação da Rede de Escolas. Reflexões, aulas para os alunos do Rio com teleconferência com colegas de Barcelona, montagem de pesquisa na ENSP em parceria com a Universidade de Aveiro sobre o tema da educação e da informação (faríamos também com a participação de Ilara) , tudo com o mesmo entusiasmo de sempre, e o bom humor do amigo e companheiro “bonitão”. Mas o que de melhor fica é a lembrança de sua amizade doce e sincera e o respeito pelo profissional que não se acomodava e que nos mobilizava para a construção de coisas novas e pioneiras. Esses são pequenos fragmentos de uma convivência rica, que refletiu a possibilidade de sermos estudiosos, trabalhadores e fraternos. Nisso Miguel foi um grande mestre da nossa Escola!"

 

Elizabeth Artmann - pesquisadora da ENSP e chefe do Daps/ENSP

 

"Miguel Murat Vasconcelos é o nome do Centro de Estudos da ENSP (Ceensp), desde 26 de março. Foi a homenagem de nossa instituição ao pesquisador que sempre defendeu o debate livre e democrático. Entrar no Daps, na ENSP, debater direito à saúde, conhecimento e informação em saúde, é lembrar de Miguel, que foi por duas vezes chefe do Daps, exercendo este cargo, quando nos deixou em maio de 2009. Eu fiz parte de sua equipe. Miguel tinha projetos pedagógicos, projetos para o Departamento, para a ENSP, para o país. Contribuiu para formar centenas de alunos, desenvolveu modelos de informação à saúde, participou ativamente do debate sobre o Cartão SUS, prestou consultorias à Opas, a secretarias de saúde, compartilhou suas ideias no Brasil e em outros países. Teve filhas, plantou árvores e escreveu livros. Ele polemizava, discordava, discutia, indicava novos textos, autores (re)descobertos. Deixou sua marca, deixou saudades. O Ceensp ganhou seu nome, uma justa homenagem, pois suas ideias eram para ser debatidas. Só não foi justo ele nos ter deixado tão cedo, mas polemizar com quem? Era meu amigo e sei que muitos colegas o consideravam assim. Ele entrava nas nossas salas, conversava sobre trabalho, sobre arte e sobre a vida. Assim lembramos dele, nós, seus colegas e amigos, que o homenageamos também num Ipê Amarelo plantado em frente à ENSP, onde dissemos sobre um “tempo em que nos reencontraremos em qualquer infinita esquina, para contar da imensa saudade...”

 

Célia Almeida - pesquisadora da ENSP

 

"Conheci Miguel Murat antes da ENSP e de nossas lutas pela Reforma Sanitária. Cruzamos em outras plagas a partir de  amigos comuns. O jeito calmo, o olhar direto, o sorriso fácil, a cortesia e a sutil ironia, sempre presentes, marcaram nossas relações, no trabalho e mesmo antes. Miguel era daquelas pessoas que se instalam sem alarde nos nossos corações e mentes e deixa saudade."

 

Vera Pepe - pesquisadora da ENSP

 

"Além das suas típicas frases contendo as palavras  "Bonitão" e "Simpatia", já tão lembradas, o Miguel traz saudades por momentos de convívio inesquecíveis. Época de tensão, com tiroteios na comunidade do entorno, impedindo a saída da ENSP. Não foram poucas as vezes em que tínhamos que deixar as salas, ir para o corredor e ficar até mais tarde, à noite, esperando poder sair e voltar para casa. Mantínhamos um "farnel" na geladeira e nas salas, em especial na da Marina, sala contígua à do Miguel. Ficávamos geralmente Marina, Miguel e eu, no corredor, matando a fome com biscoito, café, chá, pipoca ou o que mais tivesse no estoque do dia e jogando conversa fora. Esquecíamos do tiroteio e da fome, contando histórias de vida, falando do mar, das flores, dos filhos, das viagens, dos projetos e dos sonhos. De vez em quando uns "Bonitões" e umas "Simpatias", ouvindo as vozes pelas escadas, desciam os degraus e se juntavam a nós e, no fim, era pipoca para um lado, risada para outro...todos sentados no corredor se divertindo muito. Saudade do Miguel e de um tempo em que trabalhar e ficar mais tarde no trabalho, apesar dos tiroteios, podia virar quase uma festa de tanta alegria...a vida continua, o mar vai e vem, os filhos cresceram, ainda existem os tiros... mas não jogamos mais conversa fora com o Miguel, nem compartilhamos mais aquela "simpática" alegria de pessoas de diferentes departamentos da ENSP se divertindo em pleno tiroteio…"

 

Regina Murat - irmã de Miguel Murat

 

"Eu acho que ele sabia que era bonito e simpático. De maneira muito peculiar transferiu esses dons para outras pessoas. Chamando a todos de bonitão, bonitona e simpatia. Certamente que a voz doce e alegre de Miguel “oi bonitão”, “oi simpatia” ecoa ainda hoje em cada um. Miguel também brigava, lutava por seus ideais. Discordava do jogo que muitas vezes envolve o poder. Na década de 80, Miguel reorganiza sua vida sustentando corajosamente seus ideais. O conceito mais amplo de saúde passa a ser explorado com nitidez. Miguel dedica-se à Fiocruz com determinação. Integra finalmente a exigência dos estudos para se desenvolver como pesquisador: a curiosidade e a inteligência necessárias para a criação de projetos originais, o jeito de ser especial para que ocupasse cargos de liderança, a capacidade para transmitir conhecimentos, tudo isso sustentado pela crença de que todos, sem exceção, tem direito à saúde e educação como princípios fundamentais da dignidade humana. Seu trabalho importante precisava ser destacado como exemplo de dedicação 'ao fazer da Ciência e do Ensino espaços de defesa do direito universal à Saúde e ao Conhecimento', como está na placa."