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Conhecimento e educação para garantia dos direitos

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Publicado em:07/08/2013

Conhecimento e educação para garantia dos direitosA advogada da Comissão de Bioética e Biodireito da OAB, Maira Fernandes, convocou a academia e os movimentos sociais a lutarem contra o projeto de lei que considera ser um retrocesso aos direitos conquistados pela mulher ao longo de sua história. Em evento realizado na segunda-feira (5/8) pelo Grupo Direitos Humanos e Saúde da ENSP, a convidada revelou que o Estatuto do Nascituro ameaça a dignidade da mulher e o avanço da ciência, na medida em que pode impedir pesquisas com células-tronco embrionárias e até mesmo a fertilização in vitro. “É fundamental que a academia apoie as causas sociais e atue na produção de materiais que deem argumentos à sociedade”, admitiu a palestrante.

O debate marcou a abertura do II Curso de Especialização em Gênero, Sexualidade e Direitos Humanos e ocorreu no primeiro dia (5/8) do seminário Diálogos entre a Academia e os Movimentos Sociais, promovido pelo Dihs e coordenado pelas pesquisadoras Vera Marques e Rita Costa. Na segunda mesa, militantes de movimentos em defesa dos direitos das comunidades de lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros (LGBT) falaram das políticas de saúde em prol da população. A pesquisadora Maria Helena Barros é a coordenadora do Dihs.

O Estatuto do Nascituro

O Estatuto do Nascituro já foi aprovado pela Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados e depende da aprovação da Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania para ser apreciado em plenário. O projeto de lei dispõe sobre a proteção integral ao nascituro e o define como “ser humano concebido, mas ainda não nascido”. Também estabelece um conceito para o termo, no qual inclui os seres humanos concebidos in vitro, os produzidos por meio de clonagem ou por outro meio científico e eticamente aceito.

“A discussão sobre esse projeto de lei vai muito além de um debate a respeito da interrupção de uma gravidez. Um dos artigos configura como crime o ato de congelar, manipular ou utilizar nascituro como material de experimentação, colocando em risco todos os estudos com células-tronco, fertilização in vitro e a inseminação. A mídia tem divulgado a iniciativa chamada ‘bolsa estupro’, mas esses aspectos, que também expõem a gravidade da proposta, não foram contemplados”, explicou.

Em relação à pensão alimentícia paga pelo Estado, a intitulada Bolsa Estupro, Maira afirmou que é mais uma prova da desconsideração dos direitos da mulher. O parágrafo que prevê a identificação do genitor, segundo a expositora, é extremamente cruel e desumano. “Os direitos do embrião se sobrepõem aos da mulher. Essa é a lógica! Um dos exemplos dessa preponderância está claramente demonstrada na Bolsa Estupro. O estatuto prevê que o genitor seja identificado, criando essa relação parental. Esse homem pode vir a pedir a guarda da criança, sim! Pode ser herdeiro em caso de falecimento da mãe e, a partir do momento que pagar a pensão, pode entrar com ação para pedir a guarda. Isso gera um relacionamento da pessoa agredida com o estuprador.”

“Saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social”

Conhecimento e educação para garantia dos direitosCaso o genitor não seja identificado, e a mãe não tenha condições financeiras para sustentar a criança, aí sim cabe ao Estado o pagamento. “Eles tentam colocar essa situação como uma ação de proteção. É um argumento social, de solidariedade, mas que vai contra todos os direitos da mulher”, explicou. Para a pesquisadora Maria Helena, coordenadora da mesa, é mais uma forma de violência. “Não há nada mais absurdo do que o estuprador ter qualquer tipo de espaço na vida da pessoa estuprada. Ter de conviver com isso é mais uma agressão.”

Ainda de acordo com o projeto de lei, aquele que causar, culposamente, morte ao nascituro, poderá ser condenado à pena de um a três anos de prisão. Essa, na opinião da advogada, é mais uma situação absurda. “O estatuto traz uma inimaginável previsão de condenar a mulher pelo aborto culposo. Além de todo o trauma que o acidente pode lhe causar, ela ainda responderia criminalmente”, ponderou, afirmando que a mulher é colocada como um objeto pelo estatuto. “Essas previsões ferem o direito à igualdade e à saúde, pois, conforme preconiza a OMS, saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social. Ele também desconsidera as conquistas constitucionalmente garantidas ao sobrepor os direitos do embrião ao da mulher”, justificou a advogada, admitindo que, se a situação chegar ao Supremo Tribunal Federal, os juízes devem fazer valer os direitos feministas.

A saúde LGBT

“Por que a população LGBT vive em situação de vulnerabilidade e necessita de políticas públicas específicas?”, questionou o presidente do Grupo Arco-Íris, Júlio Moreira, na segunda mesa do primeiro dia do seminário Diálogos entre a Academia e os Movimentos Sociais. O tema norteou as discussões da atividade e expôs para os alunos do Curso de Especialização em Gênero e Saúde da ENSP e os demais presentes no salão internacional da Escola a necessidade de um olhar especializado do setor saúde para essa população.

“Vivemos o preconceito e sofremos com essa diferença. Isso traz impacto na nossa saúde. O ranço do machismo e da heterossexualidade compulsória nos oprime”, emendou.
 

Conhecimento e educação para garantia dos direitos


As ações governamentais em prol da saúde da população LGBT foram expostas pelo representante da Câmara Técnica de Saúde da População LGBT/RJ, André Feijó. Ele falou da Portaria nº 2.836, de 1º de dezembro de 2011, que instituiu a Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais no âmbito do SUS. “Seu objetivo geral é promover a saúde integral da população LGBT, eliminando a descriminação e o preconceito institucional e contribuindo para a redução das desigualdades e a consolidação do SUS como sistema universal, integral e equitativo”, explicou. André citou ainda as ações desenvolvidas pela Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro, o trabalho elaborado em parceria com a ouvidoria e a ação de buscar sustentabilidade das ações nos municípios do estado do Rio de Janeiro.


Sobre essas ações, o presidente do grupo Arco Íris lamentou a falta de investimento para desenvolver atividades. “Durante a década de 1990, tivemos diversas ações e projetos internacionais. Apesar de o país ter aumentado sua capacidade econômica, estamos vivendo uma época de seca. Os editais são pontuais, e o financiamento externo agora está mais focado para as ações no continente africano, justamente por entender que o Brasil se tornou uma potência econômica. Nossa sustentabilidade é o maior desafio.”

Conhecimento e educação para garantia dos direitosYone Lindgren, militante do Movimento D’Ellas, afirmou que o principal foco para combater o preconceito é a educação. Ela expôs a preocupação com a aprovação do Estatuto do Nascituro e clamou por uma união dos diversos movimentos. “Sem educação básica e sem saúde básica, não conseguiremos nada. Lutamos por todos os espaços. Sou lésbica, mulher, mãe, avó. Sou um ser humano, e não podemos lutar só pela nossa caixinha.” Yone destacou a necessidade de maior aproximação com a academia por meio da realização de um trabalho permanente com os movimentos sociais.

 


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