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Pesquisa apresenta panorama da saúde indígena

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Publicado em:18/11/2011

Isabela Schincariol

Estudo da ENSP, cujos resultados foram apresentados durante o VIII Congresso Brasileiro de Epidemiologia, promovido pela Abrasco, mostra que a realidade indígena brasileira ainda é muito preocupante. O pesquisador Carlos Coimbra (Densp/ENSP/Fiocruz) revelou que cerca de 50% das mulheres indígenas sofrem de anemia grave e, entre as crianças, esse número chega a 66% na região Norte. Além disso, 15,7% das mulheres indígenas do país são obesas e 30,2% delas apresentam sobrepeso. "O índio no Brasil sofre com uma grande carga de doenças, com a dificuldade de acesso e a baixa qualidade da atenção médica recebida, pois, mesmo nas periferias mais pobres das cidades brasileiras, índices como esses não são encontrados entre a população não índia", afirmou.

A palestra I Inquérito Nacional de Saúde e Nutrição dos Povos Indígenas: principais resultados, realizada em 16 de novembro, apresentou um panorama das condições de vida dos povos indígenas levantado pela pesquisa realizada em quatro macrorregiões do país – Norte, Nordeste, Centro-Oeste, e Sul/Sudeste, sob coordenação geral de Carlos Coimbra Jr. O trabalho foi elaborado em quatro grupos de questionários: aldeias, domicílios, mulheres e crianças. Cada um buscava aspectos específicos e gerais da organização social das aldeias, das condições ambientais, características físicas das moradias, história reprodutiva das mulheres, acesso ao pré-natal, questões biométricas, parto, práticas alimentares, morbidade e mortalidade da criança indígena, entre outros.

Sobre as mulheres, Coimbra relatou que as taxas de anemia, obesidade e sobrepeso são consideradas importantes indicadores para compreender melhor a saúde delas. Na região Norte, tanto mulheres grávidas quanto mulheres não grávidas apresentaram taxas de 50% de prevalência de anemia. Na região Sul, essas taxas ficam por volta de 30%, índice considerado alto pelos pesquisadores. Sobre o baixo índice de massa corporal (IMC), Coimbra afirmou que os dados demonstram que as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) causam um forte impacto nessa questão. “Este problema foi identificado mesmo em regiões como a Norte, onde se esperava mais atividade física e maior contato com alimentos da região, devido à grande extensão das terras indígenas”, comentou, dizendo também ser muito provável que os mesmos índices apareçam sobre os homens, que não foram contemplados neste estudo.

A respeito dos índices de parto, Coimbra disse que 60% do cenário brasileiro é de criança indígena que nasce em hospital, ressaltando que a epidemia de cesarianas também já afeta essa população, com média de 24% nessa modalidade. “Isso é assustador. Além de desmistificar a visão de que mulher índia tem o neném na beira do rio, percebemos que a nova lógica de saúde que foi construída e levou o Brasil ao posto de país campeão de cesarianas no mundo, atingiu também o cuidado médico com as indígenas. Promover a atenção pré-natal nas mulheres indígenas é algo que todos nós queremos. Mas infelizmente parece que isso vem associado a algo que não queríamos, ou seja, a epidemia de cesariana também nas indígenas”, alertou Coimbra.

De acordo com o pesquisador, todos os dados foram encaminhados para os respectivos Distritos Sanitários Indígenas, para que essas pessoas fossem acompanhadas e submetidas a outros exames.

A respeito da saúde das crianças, a pesquisa apresentou tristes indicadores com relação à anemia. A região Norte apresentou 66% de taxa, no Centro-Oeste foram 51,6% e, no Sul/Sudeste, o índice chegou a 46,6%. Vale observar que o menor índice encontrado é na região Nordeste, com 41,2% de crianças sofrendo problemas de anemia. Coimbra comentou que talvez a programação de suplementação com sulfato ferroso e outras sejam responsáveis pela melhora nessa questão. Entretanto, no Norte e no Centro-Oeste do país, tais ações têm menos continuidade e, portanto, resultados menos eficientes. “A descontinuidade é uma tônica das ações de saúde nessas duas regiões”, disse ele.

Outra questão importante é o nível de déficit estatural encontrado, sugerindo um grande problema nutricional da criança indígena. “Esses dados correm na contramão das conquistas sanitárias da população brasileira contemporânea. Encontramos prevalências de nanismo nutricional na ordem de 41% no Norte e 26% no Centro-Oeste. No Sul/Sudeste e Nordeste, essa taxa é um pouco menor”, apontou o pesquisador.

Do ponto de vista da infraestrutura das aldeias, há uma enorme heterogeneidade e diversidade nas moradias, algo que os pesquisadores não imaginavam encontrar. Com relação ao saneamento, a presença de latrinas dentro de casa, que é um indicador de bom saneamento, foi surpreendente. Na região Norte, só foi encontrada em cerca de 1% dos domicílios. No Nordeste, a taxa chegou a 40%, a maior concentração encontrada. Ainda sobre a região Norte, os dados indicam que 40% dos indivíduos utilizam o mato como banheiro; enquanto na região Sul/Sudeste – onde, segundo Coimbra, era esperada melhor condição sanitária –, a taxa foi de 36%. Também nesta região, a pesquisa apontou que 74% dos domicílios não contam com qualquer tipo de sistema de coleta de lixo.

“Esses dados, "além de nos ajudar a entender melhor o que está acontecendo e nos permitir discutir estratégias e prioridades de ação, também são reveladores do enorme fosso que separa índios e não índios no país. Apesar de ainda estarmos tateando neste grande banco de dados, o inquérito nos mostra a enorme desigualdade que se expressa nos mais variados aspectos"”, lamentou o pesquisador.

(Foto atendimento indígena: acervo pessoal do grupo de pesquisa)


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