Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca

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Dia mundial da alimentação aborda o efeito das mudanças climáticas na segurança alimentar

O Dia Mundial da Alimentação é celebrado em 16 de outubro por cerca de 150 países. Nos dias 14 e 17 de outubro a FAO - Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação vai comemorar a data que, em 2008, tem como tema 'Segurança Alimentar Mundial: os Desafios das Mudanças Climáticas e da Bioenergia'. A coordenadora do Centro Colaborador em Alimentação e Nutrição da Região Sudeste (Cecan/CSEGSF/ENSP/Fiocruz), Denise Barros, explica que a data é um marco para que todos lembrem que a alimentação é um direito universal dos povos e que, no Brasil, as conseqüências de um acesso restrito aos alimentos, bem como um consumo inadequado, contribui para a perpetuação da desnutrição e leva ao aumento de doenças crônicas, sejam doenças cardiovasculares, decorrentes da obesidade, sejam cancerígenas e ocupacionais, resultantes das contaminações biológicas e químicas do ambiente.


Segundo a FAO, existem 923 milhões de pessoas subnutridas no mundo, o que faz da fome um obstáculo para que os indivíduos sejam livres, emancipados e consigam realizar suas capacidades de maneira plena. Segundo a pesquisadora da ENSP Rosana Magalhães, do Departamento de Ciências Sociais, a FAO é um órgão que recebeu forte inspiração do pensamento de Josué de Castro em suas origens, ao atualizar o debate sobre fome e situação alimentar da população mundial, mantendo na agenda pública o problema da reconciliação entre ética e economia e, conseqüentemente, da eqüidade.

Durante a semana do Dia Mundial de Alimentação, os debates, que serão realizados pelo Brasil, ajudarão a divulgar a situação nutricional e alimentar brasileira, disseminando informações atualizadas entre as instituições públicas e a sociedade civil, suscitando em todos o interesse e a responsabilidade em contribuir com ações individuais e coletivas em prol da saúde e nutrição da população brasileira. "O Brasil, país que têm avançado na redução da desnutrição infantil, mas que vê o crescimento de problemas nutricionais como a obesidade, pode contribuir com a discussão sobre alternativas de enfrentamento da fome e participar da construção de novos aprendizados em torno de políticas efetivas de promoção da segurança alimentar e nutricional", revelou Rosana Magalhães.

Com relação a temática de 2008, Rosana Magalhães acredita que os impactos das mudanças climáticas tendem a ser expandidos e a piorarem os problemas nutricionais em várias regiões do país. "Nossa capacidade de lidar com tais mudanças vai depender de investimentos sólidos em pesquisa e escolhas políticas que busquem minimizar tais efeitos. Nem sempre serão problemas novos, mas muitas vezes dilemas antigos como a seca e falta de irrigação contínua e territorializada, capaz de dar conta não só da produção em larga escala como da agricultura familiar". Para ela, o esforço de negociação e pactuação em torno de compromissos com políticas sociais eqüitativas e iniciativas na área de alimentação, voltadas ao equacionamento do problema da falta de acesso a alimentos saudáveis e adequados para a população, podem superar as ameaças climáticas.


Assim como Rosana, Denise Barros analisa que o aquecimento global trará sérias conseqüências para a disponibilidade e qualidade sanitária da água, além das mudanças climáticas. Ações devem ser priorizadas para as regiões menos favorecidas como a região do semi-árido e os bolsões de pobreza rurais e urbanos, populações do Norte e Nordeste do país, indígenas e quilombolas.
"A água representa 70% da composição corporal dos indivíduos. A água com qualidade, sem contaminação biológica e química está cada vez mais restrita e cara. Além de importante para manter o funcionamento interno do corpo humano, ela é importante para manter os demais seres vivos - vegetais e animais - que fazem parte de nossa cadeia alimentar".

Denise cita ainda o problema gerado com a utilização de agrotóxicos para evitar pragas na agricultura e aumento da produção de alimentos. Mas, ao mesmo tempo, acontece a contaminação do solo, dos rios e dos animais e, com isso, a sociedade passa a não consumir um alimento com qualidade. Outro ponto diz respeito ao crescente consumo de alimentos industrializados que supera os alimentos 'in natura', gerando uma enorme produção de lixo inorgânico que polui e contamina o meio ambiente ou o aumento do consumo de outros ingredientes - elementos estranhos como gorduras saturadas, conservantes, entre outros - que contribuem com o aumento de doenças.


Segundo o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) a segurança alimentar e nutricional é "a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, econômica e ambientalmentalmente sustentáveis".

Essa concepção ampla envolve um conjunto de questões referentes ao comércio de alimentos; a soberania alimentar; a conformação da pobreza e da desigualdade em cada sociedade; a qualidade sanitária e nutricional dos alimentos; a privatização dos recursos ambientais e da base genética do sistema agro-alimentar; a degradação ambiental; ao processo saúde-doença e ao perfil de consumo alimentar de risco à saúde. Trata-se de um 'código de princípios' a ser implementado nas diferentes sociedades, incorporando as especificidades locais. No Brasil, explica Rosana, foi aprovada uma Política Nacional de Promoção da Saúde incorporando um debate que aponta para a necessidade de ações que ultrapassam a assistência ou o foco em áreas carentes e introduz, fortemente, as questões do desenvolvimento local, sustentabilidade, advocacia, intersetorialidade e intervenções voltadas à redução das iniqüidades em saúde, lembrando que há uma Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional aprovada em 2006.


"Ou seja, temos marcos legais para estruturar ações e, a partir desses, a meu ver, três referenciais ampliados e interrelacionados: atenção básica, promoção da saúde e segurança alimentar e nutricional. A questão da segurança alimentar - esse enfoque ampliado e convergente com os novos olhares sobre atenção básica e promoção da saúde - precisa alcançar seu potencial como campo de interlocução e proposta de reorientação na saúde através de mudanças institucionais com enfoque intersetorial. O desafio é, portanto, garantir a eqüidade nutricional a partir da reconstrução das políticas na área, superando lógicas muitas vezes fragmentadas, superpostas e descontínuas", ressaltou Rosana Magalhães.

Denise Barros afirma que a grande discussão mundial e brasileira gira em torno de políticas para agricultura. A preocupação com a monocultura de alguns alimentos para a produção de biocombustível no Brasil é grande. Nessa perspectiva, como resultado das reflexões da 'III Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional', realizada em 2007, que estabeleceu algumas prioridades, o governo tem investido no fortalecimento do Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA), na revisão da Lei de Biossegurança, com a suspensão da liberalização dos produtos transgênicos, e na definição de uma política energética sustentável que assegure a segurança alimentar e nutricional e limite o avanço das monoculturas. "O acompanhamento dessas ações tem sido descentralizado e partilhado com a sociedade civil por meio do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea) e pelos Conseas estaduais e municipais, fortalecendo a execução e implantação das ações e programas nos diferentes âmbitos da federação", encerrou.

Seminário debate relação entre cultura e alimentação

Entre os dias 12 e 17 de novembro, acontecerá, em Salvador (BA), o 'II Simpósio Internacional de Alimentação e Cultura'. Segundo Denise Barros, os problemas alimentares da população brasileira são complexos e impõem desafios para as políticas públicas. De um lado a desnutrição, especialmente em regiões de pobreza, vulnerabilidade social e dificuldade de acesso aos alimentos, de outro a emergência da obesidade, o aumento do consumo de alimentos ricos em gorduras, açúcar e produtos químicos.

A abordagem adequada dessas questões exige um conhecimento amplo e diverso sobre os modos de comer que interessam a pesquisadores, estudantes e profissionais da saúde. Para ela, a importância dos aspectos culturais nas escolhas alimentares dos indivíduos é de fundamental importância para a compreensão das práticas relacionadas à alimentação enquanto uma esfera específica dos grupos sociais que ultrapassa a dimensão biológica e nutricional. "Nesse sentido, a Rede Alimentação e Cultura está promovendo este II Simpósio com objetivo de discutir o tema da alimentação em sua interface com as ciências sociais, reunindo pesquisadores nacionais e internacionais".

A conferência de abertura, com o tema 'Saúde, alimentação e cultura: dilemas e desafios do tema para o século XXI' será proferida pelo professor Claude Fischler (EHESS & CNRS, França), um sociólogo, pesquisador do CNRS (Centre National de la Recherche Scientifique) e que atualmente dirige o Centro Edgar Morin (antigo CETSAH - Centro de Estudos Transdisciplinares - Sociologia, Antropologia e História). Também é membro do Comitê Científico do Observatório Cniel dos Hábitos Alimentares (Ocha) e co-fundador do Instituto Interdisciplinar de Antropologia da Contemporaneidade.

Desde a década de 70, dedica-se a pesquisas sobre a alimentação, com uma perspectiva interdisciplinar particularmente sobre hábitos alimentares, formação do gosto e manifestações contemporâneas do comer ligado à noção de risco alimentar. Recentemente, dirigiu uma grande pesquisa comparativa transcultural sobre as atitudes relativas à alimentação, à saúde, ao prazer e ao corpo e publicou, em 2008, os resultados no livro 'Manger: Français, européens et américains face a l'alimentation'.


Sobre o papel da Rede Interinstitucional de Pesquisa sobre Alimentação e Cultura (Rede A&C), Denise Barros revela que o grupo congrega pesquisadores da UFRJ, Uerj, UFBA, UNB, UFRGS, UB (Barcelona) e UAM (México) voltados para a temática da alimentação em sua dimensão sociocultural. Os objetivos do grupo são o desenvolvimento de atividades de ensino, as pesquisas, a promoção de debates científicos e a disseminação de informações nesse campo de conhecimentos e saberes. "Cabe ressaltar que a Rede A&C tem como propósito a manutenção da periodicidade deste Simpósio como forma de fortalecer o campo alimentação e cultura em conformação particularmente para os nutricionistas", concluiu. As inscrições para o simpósio estão abertas até o dia 31 de outubro e podem ser feitas pelo preenchimento da ficha de inscrição.

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