Rio, 12/10/2024
Mais Médicos é uma Política de Estado bem-sucedida
24/11/2016
O governo brasileiro renovou, por mais três anos, o Programa Mais Médicos. O acordo, assinado durante a 55ª Reunião do Conselho Diretor da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), mantém a participação dos médicos da cooperação internacional no PMM visando, justamente, atender ao apelo dos gestores municipais e não deixar desassistida a população dos locais onde os médicos cooperados atuam.
Em 2013, por iniciativa do Ministério da Educação, a Fundação Oswaldo Cruz e a Universidade Federal de Brasília coordenaram a pesquisa de Avaliação do Mais Médicos, cujo principal objetivo foi avaliar, com base em quatro componentes (1. Profissionais graduados no Brasil; 2. Brasileiros que fizeram o curso fora do país e vieram participar do programa; 3. Estrangeiros que se inscreveram para participar do Mais Médicos; 4. Médicos cubanos), a implantação, o desenvolvimento, o consolidação e o impacto das ações lançadas por tal programa no país.
Na opinião da pesquisadora Maria Helena Machado, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, a renovação fortalece não só a importância do PMM como política de Estado, como também reforça o apoio da população ao ‘Mais Médicos’. Confira, na entrevista concedida ao Informe ENSP, os principais pontos da avaliação do Programa, a importância da renovação e a contradição desse modelo de atenção com a proposta de criar planos populares de saúde.
Informe ENSP: O Ministério da Saúde assinou, na sede da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), em Washington, Estados Unidos, o contrato que mantém, por mais três anos, a participação dos médicos da cooperação internacional no Programa Mais Médicos. Na opinião da senhora, qual é a importância dessa renovação?
Maria Helena Machado: A recente renovação do Programa Mais Médicos (PMM) só reforça a relevância do programa proposto pelo governo Dilma - que acertou em cheio. A questão, agora, é verificar a dimensão dessa renovação do contrato do PMM, entendendo que o programa contempla não só a fixação de profissionais em lugares longínquos, de difícil acesso, e a escassez de profissionais, mas também a graduação, com a abertura de novos cursos em lugares de carência de médicos e da pós-graduação (Programa de Residência Médica). Isso foi bastante positivo e chancela o PMM como uma Política de Estado.
Informe ENSP: Uma das metas do novo contrato consiste na ampliação da participação de brasileiros com a oferta, nos próximos três anos, de 4 mil vagas hoje ocupadas pelos médicos do acordo internacional. Como a senhora enxerga a proposta?
Maria Helena Machado: No meu ponto de vista, a proposta de reforçar a contratação de médicos brasileiros é um pouco redundante, uma vez que, em nenhum momento, o PMM deixou de ser um programa para médicos brasileiros. Incialmente, houve baixa adesão dos médicos do nosso país, mas, nos últimos editais, ainda no governo Dilma, todas as vagas foram preenchidas por médicos brasileiros. O Mais Médicos é um programa nacional; um programa que tem e deve ter a participação de médicos brasileiros preferencialmente para atingir a população brasileira. Em momento algum, isso deixou de ter importância.
Informe ENSP: Qual avaliação a senhora faz da participação dos médicos estrangeiros no Programa?
Maria Helena Machado: No que diz respeito à participação dos médicos estrangeiros, diferente do que parte da categoria médica critica, vejo a atuação como extremamente positiva, pois demonstra nossa capacidade de interlocução com o mundo. Para ter uma ideia, o PMM abrange 47 países, e isso é de grande expressão. Imaginar que o programa atingiu médicos de todas essas nacionalidades estimula a troca de experiências, a forma de agir e de pensar – que difere da nossa. Ao mesmo tempo que nós, brasileiros, aprendemos com a experiência internacional, eles também aprendem muito com a realidade brasileira.
É importante destacar que os médicos cubanos têm presença mais forte e dominam esse contingente de estrangeiros, principalmente por conta de um convênio de cooperação com Cuba, que atendeu ao chamado brasileiro e abriu para os médicos que fazem esse trabalho relevante e muito bem avaliado pela população.
Informe ENSP: Em dezembro de 2013, a senhora concedeu entrevista ao Informe ENSP, na qual revelou que a Fundação Oswaldo Cruz, por intermédio da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, coordenaria a pesquisa de avaliação do programa Mais Médicos. Quais são os resultados da pesquisa?
Maria Helena Machado: A pesquisa de avaliação do Programa Mais Médicos foi financiada pelo MEC e coordenada por mim e pelo professor Joaquim Soares Neto, da UNB. Essa pesquisa gerou o relatório em formato de livro intitulado O Programa Mais Médicos e a Atenção Básica, que será lançado, até o final deste ano, pela Editora Prisma.
Discutimos vários itens importantes na pesquisa. Fizemos um levantamento do que é a atenção básica, coletamos depoimentos das autoridades sobre o PMM – o que nos permitiu ter a avaliação dos gestores –, além de traçarmos o perfil desses trabalhadores. Nesse quesito, a pesquisa revela um perfil bem diferente entre médicos brasileiros e estrangeiros.
O estudo demonstra a concentração de médicos brasileiros em determinadas regiões do país e a ausência desses profissionais na Região Norte, nas áreas fronteiriças e indígenas, por exemplo. E são justamente os médicos cubanos que atuam nessas regiões.
Destacamos, no capítulo sobre a formação médica, a necessidade de o país avançar em uma política reformadora, que leve o médico a entender que o grande empregador do país é o Sistema Único de Saúde, e eles devem se preparar para esse mercado de trabalho. Há também uma discussão sobre a evolução da infraestrutura das Unidades Básicas de Saúde, sobre o papel do supervisor e suas dificuldades na avaliação dos profissionais. E analisamos a “imagem” no PMM na mídia escrita. Neste último quesito, coletamos mais de dois anos de material na mídia e notamos uma mudança de comportamento. Apesar de todas as críticas em relação ao PMM, observamos uma mudança de comportamento, ou seja, o reconhecimento de que o Programa foi bem aceito pela população e trata-se de uma iniciativa de muita repercussão no meio da população.
A ideia, num segundo momento, é poder avaliar, de forma mais criteriosa, as escolas médicas frente ao decreto e o programa de residência médica – que pode ser alvo de nossa avaliação.
Informe ENSP: A proposta de criação dos planos “acessíveis” de saúde, presente na fala do atual ministro, mostra-se um contrassenso em relação à ampliação do Mais Médicos e ao fortalecimento do SUS. Como a senhora vê essa proposta?
Maria Helena Machado: Há grande incoerência na proposta de criação dos planos populares de saúde. Vejo essa ação como um contrassenso descabido e um risco à integridade do SUS. A meu ver, é totalmente contraditório com a proposta de renovação do Mais Médicos. Considero ser uma temeridade essa perspectiva de ter planos “acessíveis”.
Se o SUS hoje é deficitário do ponto de vista de infraestrutura e da força de trabalho, fico imaginando o que seria um plano popular. Aposto mais na perspectiva do reforço da atenção básica, no Saúde da Família, do PMM, uma vez que são políticas corretas e coerentes com o SUS e a população possa recorrer continuadamente, sem custos.
Se fizermos uma enquete com a população em relação ao PMM onde há o programa, garanto que a população ficará contra qualquer alteração nele. Na verdade, a renovação do contrato pelo governo federal só reforça que o PMM é uma política de Estado, a qual a população avalia positivamente.
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